JUSTIÇA IGUAL PARA TODOS: REALIDADE OU UTOPIA?
"Nenhum outro direito a não ser o direito natural". Assim Aslan interpreta o 7º Grau no REAA, e complementa afirmando que este grau é consagrado "à equidade severa com que devemos julgar nossas ações" e que a moral que dele se depreende é "a justiça igual para todos".
Como pedras brutas em lapidação que somos, poderemos atingir tão ambicioso nirvana, em tão curta existência? É possível para a sociedade humana estabelecer um sistema de direito que agrade a todos? Enquanto Maçons, conseguiremos, com equidade, "julgar nossas próprias ações" e a de nossos semelhantes? Realidade ou utopia?
Vindos de todas as partes e trabalhando em variados horários, eis o que se espera de um Maçom: a busca pelo direito; um severo julgamento das ações; e a equidade absoluta na distribuição de justiça!
Nestas mal traçadas linhas, que não pretendem esgotar o tema, recorremos aos achados do filósofo americano John Rawls (1921-2002), defendidas em sua obra "Uma teoria da justiça", bem como o alcance das chamadas ciências humanas.
Com Marilena Chauí, filósofa brasileira, perguntamos: É possível "ciências humanas"?
Por fim, voltamos ao princípio e buscamos luzes no Livro da Lei: A Bíblia!
Buscaremos assim corroborar nossa intuição, inicial, de que para a humanidade "Justiça igual para todos", é sim, uma utopia... mas que vale a pena ser perseguida!
Iniciemos, pois, nossa conversa.
Contrato social e posição original
O objetivo deste trabalho é expor parte do pensamento do filósofo John Rawls, em seu livro "Uma Teoria da Justiça", e, de alguma maneira, buscar alinhá-lo (ou contrapô-lo!?) às colocações de Marilena Chauí em sua obra "Convite à filosofia".
A representação da justiça como uma mulher de olhos vendados com uma balança, expressa a ideia [natural] de que ninguém está acima da lei. À pacificar esta ideia-força temos que: a justiça é cega, e portanto, imparcial; a balança da justiça representa a igualdade; e a punição [que tem na espada seu maior símbolo] é a mesma para todos.
Conforme a teoria do "contrato social" (apresentada em 1651 por Thomas Hobbes, em "Leviatã"), o controle da lei como uma forma de "contrato" celebrado pela sociedade, rende benefícios superiores aos obtidos individualmente.
Rawls, por sua vez, apresentou em 1971 uma versão que envolve uma experiência na qual indivíduos são levados a "esquecer" seu lugar na sociedade, ou são colocados no que o filósofo chamou de "posição original" na qual o contrato social é feito. A partir disso são estabelecidos princípios de justiça em relação aos quais, Rawls afirmava, todos os seres racionais devem concordar. John Rawls (1921 - 2002)
Imagem disponível em https://www.paginasdefilosofia.net/rawls-a-justica/john-rawls-by-victor066/ |
Que princípios eram esses?
Entre os princípios de justiça elencados pelo filósofo, se destacam dois, a saber: o primeiro trata da liberdade, e o segundo lida com a distribuição de renda e riqueza, assim como da autoridade e da responsabilidade.
A partir do princípio da "Liberdade", Rawls apresenta uma lista das liberdades básicas. As mais importantes entre elas são [segundo Rawls] a liberdade política, de expressão e de reunião; a liberdade de consciência e de pensamento; as liberdades da pessoa, que incluem a proteção contra a opressão psicológica e a agressão física; o direito à propriedade privada e a proteção contra a prisão e a detenção arbitrárias, de acordo com o conceito de "estado de direito".
Segundo o filósofo, essas liberdades devem ser iguais.
Dessas considerações deduzimos o quão difícil tem sido para a humanidade a busca de achar o denominador comum em busca do justo, e não mais fácil será a nossa, maçons, de buscar o direito natural dentre tantas demandas individuais, não só em nossas oficinas maçônicas, mas no meio social em que vivemos, e distribuir a justiça entre nossos Irmãos e concidadãos, em meio a origens, vivências e interesses díspares.
Onde encontrar então, na vasta seara do conhecimento humano, o sopro divino da justiça cega, imparcial e justa? As ditas "ciências humanas" poderão nos auxiliar? Sobre isso, vejamos o que nos diz Chauí.
Com esta pergunta Chauí (2006, p. 226) nos conduz aos contrapontos existentes entre essa ciência "noveau" e as milenares ciências matemáticas e naturais, posto que o ser humano como objeto de estudo, é uma ideia surgida apenas no século XIX. Assevera a destacada professora que, por não conseguir realizar a transposição integral e perfeita das técnicas, métodos e das teorias naturais daquelas ciências para o estudo dos fatos humanos, as ciências humanas acabaram por trabalhar por analogia com àquelas, tornando seus [próprios] estudos muito contestáveis ao longo dos anos.
Apesar de todos esses aparentes óbices às ditas "ciências humanas" e dentre os seus principais campos de investigação (Psicologia, Economia, Antropologia, História, Lingüística e Psicanálise), o que mais de perto poderia responder ao título proposto neste trabalho, acredito, é a Sociologia, uma vez que essa área do conhecimento se dedica a estudar as relações sociais e suas transformações.
O destaque no parágrafo anterior serve para lembrar que a justiça de hoje, não é a mesma de ontem, e vice-versa, já que o conceito está sujeito a transformações cíclicas. A marcha das sociedades e, por consequência, das relações sociais, imprime uma variedade de possíveis interpretações do termo "justiça".
O Prof. Tércio Machado Siqueira [1] nos apresenta algumas citações do Novo Testamento (NT), que, segundo ele, nos dão conta de que o conceito de "justiça" nelas mostrado, não parece [se] adequar com a definição secular, conforme o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, publicado pela Editora Objetivo, Rio de Janeiro, 2001: "Justiça é o caráter, qualidade do que está em conformidade com o que é direito com o que é justo; princípio moral em nome do qual o direito deve ser respeitado".
Eis alguns textos do NT que mostram um conceito diferente do secular:
"Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça..." (Mt 6.33);
"Porque nele a justiça de Deus se revela de fé para a fé, conforme está escrito: o justo viverá da fé" (Rm 1.17);
"Por conseguinte, assim como pela falta de um só resultado a condenação para todos os homens; do mesmo modo, da obra de justiça de um só, resultou para todos os homens justificação que traz a vida" (Rm 5.18);
"... como imperou o pecado na morte, assim também imperasse a graça por meio da justiça, para a vida eterna, através de Jesus Cristo..." (Rm 5.21); e
"... segue a justiça, a fé, a caridade, a paz com aqueles que, de co- ração puro invocam o nome do Senhor" (2Tm 2.22).
[1] Disponível em:< http://www.metodista.br/fateo/materiais-de-apoio/estudos- biblicos/deixa-estar-por-enquanto-porque-assim-nos-convem-cumprir-toda-a-justica>. Último acesso em 31 mai. 12.
| Através destes textos do NT, percebe-se que o conceito "justiça" está próximo de termos como: Reino de Deus, fé, fidelidade, justificação que traz vida e vida eterna, amor e paz. Os textos bíblicos mencionados não identificam a "justiça" com tribunal, lei, julgamento, condenação, prisão etc. Já no Velho Testamento, na infância da civilização, a justiça era na base do "olho por olho, dente por dente". |
República ontem, reino hoje, império amanhã, tais são as fantásticas mutações da cena das nações, e em cada um desses períodos, uma "nova" maneira de aplicar e distribuir a justiça.
Não devemos deixar de servir ao povo quando ele precisar dos nossos serviços, na difícil missão de lidar com a justiça. Devemos, sim, ajudar a conduzir nossas ações, sempre pelos caminhos da Liberdade e da Justiça.
Continuemos, pois, a buscar essa maravilhosa utopia humana, agindo com isenção, espírito apaziguador e leveza de consciência. E queira o Senhor dos Mundos que consigamos chegar à realidade da "JUSTIÇA IGUAL PARA TODOS".