Maçonaria e Inconfidência Mineira: Uma Visão Historiográfica

Decodificando a Inconfidência Mineira

Por Raul Sturari em 13/06/2023 às 14:12:47

Tiradentes esquartejado óleo sobre tela de Pedro Américo

MAÇONARIA E INCONFIDÊNCIA MINEIRA

UMA VISÃO HISTORIOGRÁFICA


1. INTRODUÇÃO

A participação da Maçonaria na InconfidĂȘncia Mineira tem sido objeto de discussões e polĂȘmicas no mundo maçônico brasileiro. De um lado, hĂĄ os "emotivos", que vĂȘm participação da Sublime Ordem em tudo o que de bom ocorreu na História da Humanidade desde a pré-História mas, principalmente, após o advento da fase especulativa, cujo marco remonta à fundação da Grande Loja de Londres, em 1717. No outro extremo estão os "céticos e autĂȘnticos", que só aceitam como verdade histórica aquilo que estĂĄ documentado, com provas conclusivas.

Os primeiros — como não podia deixar de ser — advogam que o movimento revolucionĂĄrio ocorrido no Brasil nas Ășltimas décadas do Séc. XVIII foi inspirado, conduzido e liderado pela Maçonaria, cujos membros eram dotados dos mesmos ideais daqueles que se dedicaram à independĂȘncia norte-americana (1776) e à Revolução Francesa de 1789.

Os céticos consideram que a primeira Loja Maçônica em território brasileiro que se tem registro foi a "Cavaleiros da Luz", fundada em 1797 no povoado da Barra, na Bahia. As primeiras sessões foram feitas a bordo da Fragata "La Preneuse", ancorada nas proximidades, sob o comando do monsieur Larcher. Participaram dela Cypriano Barata, José da Silva Lisboa, Francisco Munis Barreto, padre Francisco Agostinho Gomes e outros[1]. A InconfidĂȘncia Mineira, portanto, denunciada em 1789, não poderia ter sido obra da Maçonaria.

Buscando luzes sobre o assunto — e sem querer fugir do lugar comum — é preciso afirmar que a virtude estĂĄ nas posições intermediĂĄrias, sem, contudo, abrir mão do rigor acadĂȘmico e da seriedade que devem pautar os estudos históricos.

2. UMA VISÃO HISTORIOGRÁFICA

Lamentavelmente, as pesquisas realizadas permitem afirmar que grande parte das fontes disponĂ­veis sobre o tema situam-se próximas aos extremos citados — emotivos e céticos.

Todavia, hĂĄ um livro que, se não esgota o assunto, traz uma visão verdadeiramente historiogrĂĄfica sobre o assunto: A InconfidĂȘncia Mineira – Uma SĂ­ntese Factual, do Dr. MĂĄrcio José da Cunha Jardim, publicado no Rio de Janeiro, em 1989, pela Biblioteca do Exército.

MĂĄrcio Jardim nasceu em Brumadinho, Minas Gerais, em 1952. Fez seus estudos em Belo Horizonte, graduando-se em História (UFMG, 1974) e em Direito (FADOM, 1986). É membro da Ordem Nacional dos Bandeirantes, de São Paulo, e sócio correspondente da Academia Paulistana de História. É sócio efetivo do Instituto Histórico e GeogrĂĄfico de Minas Gerais. O livro tem o sumĂĄrio a seguir apresentado:

Nota Explicativa

1. Introdução

2. A Bibliografia da Obra

3. A Sociedade Mineira no Final do Século XVIII

4. Os Inconfidentes

5. A Maçonaria

6. O Movimento

7. A Devassa

8. Final da História

Bibliografia

O CapĂ­tulo 5, portanto, foi inteiramente dedicado à Maçonaria. Nele, o autor apresenta um detalhado preâmbulo, onde responde — na sua visão — a algumas "perguntas bĂĄsicas":

· O que é a Maçonaria?

· Quais eram os princĂ­pios defendidos pela Maçonaria?

· Quando se introduziu a Maçonaria no Brasil?

A seguir, MĂĄrcio Jardim passa a tratar especificamente da participação da Maçonaria na InconfidĂȘncia Mineira, apresentando o que chama de:

· indícios insubsistentes;

· indícios concretos; e

· provas.

Ressalte-se, antecipadamente, que as provas por ele apresentadas referem-se somente à existĂȘncia de inconfidentes sabidamente maçons, ou seja, nada relacionado à participação institucional da Ordem no movimento.

Merece destaque o extenso trabalho de pesquisa realizado pelo autor, em grande parte buscando fontes primĂĄrias. Mesmo quando se refere a outros pesquisadores, MĂĄrcio Jardim tem o cuidado de conferir a procedĂȘncia e, sempre que cabĂ­vel, duvidar da veracidade de suas afirmativas. Tanto é assim que dedica todo o CapĂ­tulo 2 a explicar não somente a bibliografia de sua obra como também a própria historiografia da InconfidĂȘncia Mineira.

Por isso não é de se estranhar que MĂĄrcio Jardim contradiga, com sabedoria, mesmo um autor por ele reconhecido como "excepcional", TarquĂ­nio J. B. de Oliveira, quando este afirma ter sido de carĂĄter maçônico uma reunião realizada em 26/12/1788. Do mesmo modo, contesta firmemente diversas assertivas do maçom Tenório Albuquerque, autor do livro "A Maçonaria e a InconfidĂȘncia Mineira: Movimento de CarĂĄter Maçônico". Discorda também, com elegância, das afirmações dos "emotivos" maçons Manoel Rodrigues Ferreira e Tito LĂ­vio Ferreira, que escreveram "A Maçonaria na IndependĂȘncia Brasileira".

HĂĄ, portanto, no entender desse historiador, nove indĂ­cios insubsistentes da participação da Maçonaria na InconfidĂȘncia Mineira, a saber:

1. A palavra "mazombo".

2. Os "sinais" de Thomas Jeferson.

3. O "irmão" de Tiradentes.

4. O "companheiro" de ClĂĄudio Manoel da Costa.

5. A "iniciação" de Tiradentes por Álvares Maciel.

6. 0 "embuçado" de Vila Rica.

7. 0 triângulo da bandeira da InconfidĂȘncia.

8. O carĂĄter maçônico da reunião de 26.12.1788.

9. As informações de Joaquim FelĂ­cio dos Santos.

Quanto aos "indĂ­cios concretos", o autor considera que todos estão relacionados aos procedimentos e atitudes de importantes comerciantes cariocas, os quais tinham patentes ligações com João Rodrigues de Macedo e Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.

Na sequĂȘncia, MĂĄrcio Jardim narra que encontrou "provas de que houve dois indivĂ­duos maçons no movimento". Interessante a percepção do historiador, quando afirma que

O instinto me diz que houve mais de uma dezena de maçons entre os inconfidentes de 1785-1789, mas as provas que posso apresentar se limitam a duas pessoas: José Álvares Maciel e Padre LuĂ­s Vieira da Silva. É natural que, do cotejo dessas provas, se depreende a existĂȘncia de diversos outros maçons, mas, infelizmente, não em carĂĄter documental (JARDIM, 1989).

2. CONCLUSÕES

Nas conclusões, MĂĄrcio Jardim sintetiza:

· A InconfidĂȘncia Mineira não foi dirigida pela Maçonaria;

· Tampouco foi um movimento exclusiva ou preponderantemente maçônico;

· Muitos inconfidentes não eram maçons;

· As ideias maçônicas foram importantes para "aglutinar elementos e ideais predispostos por condições estruturais ao movimento de independĂȘncia";

· As divergĂȘncias verificadas entre os inconfidentes tiveram origem polĂ­tica e não podem ser vistas apenas sob o ângulo maçônico;

· Maçons estiveram presente nas articulações do movimento no Rio de Janeiro e em Vila Rica; e

· Havia Lojas Maçônicas organizadas, principalmente no Rio de Janeiro, mas ainda em carĂĄter totalmente embrionĂĄrio.

Assim sendo, é possĂ­vel que vĂĄrios inconfidentes tenham sido maçons e que o movimento tenha sido conduzido com caracterĂ­sticas maçônicas. Contudo, trata-se somente de uma possibilidade, até o momento carente de provas obtidas em fontes primĂĄrias.

Tendo em vista a importância deste livro e, em especial, de seu CapĂ­tulo 5, foi efetuado um trabalho de transcrição e digitalização, de modo que este pudesse ser disponibilizado, via internet, a todos os que se interessam pelo tema.

Boa leitura.

BrasĂ­lia, DF, 21 de abril de 2023

Raul José de Abreu Sturari, Mestre Maçom

[1] CASTELLANI, José. História do Grande Oriente do Brasil. BrasĂ­lia: Grande Oriente do Brasil, 1993.




Extrato (CapĂ­tulo 5) do livro a seguir referenciado, bem como da bibliografia relacionada.

JARDIM, MĂĄrcio. A InconfidĂȘncia Mineira – Uma SĂ­ntese Factual. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1989 – pĂĄg. 311 a 343.

Observação: trata-se de uma transcrição fiel, onde foram mantidos eventuais erros de ortografia e pontuação, bem como deslizes em relação às normas técnicas da ABNT.

5. A MAÇONARIA

A participação da Maçonaria no movimento revolucionĂĄrio dos mineiros de 1785-1789 é tema controverso; embora essa sociedade tenha recebido pouca atenção dos historiadores, foi revolucionĂĄria no século XVIII e representou o canal polĂ­tico de ascensão de uma nova classe no comando polĂ­tico dos Estados, submetidos ao Antigo Regime absolutista e sua nobreza hereditĂĄria. À Historia, a meu ver, interessa tudo, com maior ou menor importância; por isso, dedico estas linhas a um pequeno estudo sobre a Maçonaria na InconfidĂȘncia Mineira, porque acredito ter encontrado indĂ­cios documentais suficientes para detectar sua presença no movimento.

Em primeiro lugar, é preciso responder a algumas perguntas bĂĄsicas introdutórias; a primeira delas: — O que é a Maçonaria? É uma associação civil, criada em tempos imemoriais, que, segundo alguns, remontam à época bĂ­blica, e segundo outros, às corporações de ofĂ­cio medievais. A associação usa sĂ­mbolos, terminologia e procedimentos baseados em objetos de culto egĂ­pcio, judaico, e, sobretudo, objetos de trabalho de oficiais mecânicos da construção civil, como a colher de pedreiro, a régua, o compasso, o prumo e o nĂ­vel. Devo esclarecer que a Maçonaria deixou hĂĄ muito tempo de ser uma associação secreta para ser uma associação discreta; as informações sobre ela estão ao alcance de todos em qualquer livraria. Como todo organismo, a Maçonaria tem uma história própria que, quanto aos seus primórdios, mistura história e lenda. A história moderna da Maçonaria deve ser fixada no século XVIII, a partir de 1717, por dois fenômenos polĂ­ticos paralelos: do lado organizacional, houve uma influĂȘncia decisiva do pastor presbiteriano londrino James Anderson (n. 1684, f. 1739), que reuniu os documentos esparsos e confusos sobre a Ordem, tentando dar-lhes um sentido Ășnico. Em 1721, Anderson foi encarregado pelos seus colegas maçons de redigir uma Constituição, trabalho que, revisto por uma comissão oficial da Ordem, foi aprovado em 1723 como a Constituição Maçônica para todo o mundo (para todo o universo, como dizem os maçons); o trabalho ficou conhecido como a Constituição de Anderson e é ainda hoje o documento bĂĄsico de toda a Maçonaria[1] O outro fenômeno paralelo é a situação polĂ­tica inglesa: a Inglaterra, hĂĄ vĂĄrios séculos, impusera limitações ao poder absoluto da Monarquia, mas sempre houve resistĂȘncia. No final do século XVII, a Revolução dita Gloriosa acabou por vencer o Absolutismo e impor a Monarquia Constitucional. Mas, como os fenômenos polĂ­ticos são sempre mutantes, os constitucionalistas nunca arredaram pé de sua vigilância sobre o antigo leão feroz do Absolutismo. Guilherme de Orange, holandĂȘs, assumiu o Trono da Inglaterra em fins do século XVII, com o apoio dos protestantes anglicanos e contra a oposição dos Stuarts, católicos. A Maçonaria inglesa, nesse momento, tomou posição firme ao lado da Casa de Orange — que representava a defesa do constitucionalismo, do anglicanismo e da independĂȘncia, contra as ameaças das grandes monarquias absolutistas da França e Espanha. Seu objetivo era unir a Inglaterra, fortalecĂȘ-la e defender os princĂ­pios maçônicos; luta, assim, para vencer a resistĂȘncia dos poderosos da Escócia, partidĂĄrios da Casa de Stuart. Nessa luta, a Maçonaria apresenta-se como liberal e nacionalista, tornando-se os seus adversĂĄrios sĂ­mbolos da reação e do Catolicismo. A guerra, como sabemos, foi favorĂĄvel aos protestantes que, literalmente, decapitaram os Stuarts, cuja figura maior foi a "rainha escocesa" Mary. Uniu-se desse modo, definitivamente, a Maçonaria ao Trono InglĂȘs, anglicano e constitucional, fenômeno que perdura até hoje[2]. O Duque de Kent, primo da Rainha, por tradição, é o Grão-Mestre da Maçonaria Inglesa. Quem quiser localizĂĄ-lo visualmente, ele é a aquele calvo e afĂĄvel cavalheiro que, ao lado de sua esposa duquesa, entrega anualmente os troféus aos vencedores do famoso torneio de tĂȘnis de Wimbledon[3].

Uma vitória interna não descuidava dos inimigos externos. A Maçonaria inglesa partiu então para uma segunda etapa: influenciar a França e outros paĂ­ses católicos, através da criação de lojas maçônicas no continente, para defender suas ideias e consolidar a transição pacĂ­fica do Cristianismo protestante contra o Catolicismo. Ainda respondendo àquela primeira pergunta bĂĄsica, devo dizer que a Maçonaria precisava atuar nas sombras, isto é, sem expor publicamente seus intentos. DaĂ­ a empatia natural entre os antigos métodos secretos de trabalho da associação com as necessidades do tempo revolucionĂĄrio que era o século XVIII. A Maçonaria adotou então, adaptando os rituais antigos, uma metodologia de segredo, mistério e seleção rigorosa dos associados, também como forma de defesa. Num tempo em que eram rigorosamente proibidos e inexistentes os partidos polĂ­ticos, a Maçonaria passou a ser o canal para onde convergiam os pensadores de diversas tendĂȘncias[4]. Seria incruento se a Maçonaria inglesa conseguisse pacificamente seus objetivos que eram os mesmos da Monarquia inglesa: consolidar e aumentar o poderio e a influĂȘncia da velha Albion. Mas não foi. A França iniciou a reação, ainda antes da Revolução Francesa de 1789. Nas centenas de lojas maçônicas francesas, digladiavam-se as diversas tendĂȘncias polĂ­ticas, surgindo a RepĂșblica como ideal para muitos, na transição do Antigo Regime para um novo, passando além do que ocorrera na Inglaterra, de um simples tipo de monarquia para outro. Os historiadores MANOEL RODRIGUES FERREIRA e TITO LÍVIO FERREIRA criaram genialmente, as expressões "Maçonaria Azul" e "Maçonaria Vermelha" para distinguir essa cisão que se efetivaria com a fundação do Grande Oriente FrancĂȘs, de tendĂȘncia nitidamente republicana; passa a existir agora a expressão "franc-maçon", que tanto pode ser traduzida como "pedreiro-livre" (em inglĂȘs pervertido), como por "maçom francĂȘs", que parece ter sido o sentido original do termo[5].

A historiografia registra que na França, em 1775, existiam 104 lojas maçônicas, sendo 23 em Paris, 71 no interior, 10 especĂ­ficas de militares e 45 em organização. Em 1789, o quadro era de 614 (ou 703) lojas, sendo 65 em Paris, 442 no interior, 38 nas colônias do exterior, 69 militares. Na Inglaterra havia 525 lojas; nos Estados Unidos, 85; na Irlanda, 227[6]. Esse era o ambiente polĂ­tico encontrado pelos jovens brasileiros que estudaram na França e em Coimbra na década de 1780 e que se destacariam na InconfidĂȘncia de 1785-1789 (Domingos Vidal de Barbosa Laje, José Joaquim da Maia, José Mariano Leal da Câmara, José Álvares Maciel e vĂĄrios outros). José Joaquim da Maia, carioca, seria enviado por comerciantes liberais do Rio de Janeiro a conversar com Thomas Jefferson, embaixador dos Estados Unidos na França, em 1787, encontro que contou também com a presença de Domingos Vidal de Barbosa Laje. De passagem, diga-se que Jefferson era o sucessor de Benjamim Franklin no posto e que este fora, em sua estada na França, VenerĂĄvel Mestre (chefe) de uma loja (Neuf-Soeurs), a mesma em que se iniciou Voltaire[7]. O intermediĂĄrio entre Maia e Jefferson fora o Professor José Maria Joaquim Vigarous, de Montpellier, que pertencera às lojas parisienses "L"Amenité" e "La Moderatión", de 1784 a 1787[8]*[9].

Passemos agora a outra pergunta bĂĄsica — quais eram os princĂ­pios defendidos pela Maçonaria? Liberdade, igualdade e fraternidade é a resposta conhecida de todos. Ultrapassados mais de duzentos anos de sua ideação, parecem hoje princĂ­pios amorfos. Mas não o eram num tempo em que as classes sociais eram rigorosamente estratificadas desde o nascimento, e no qual, sobretudo, era reservado a uma só classe — a nobreza — o exercĂ­cio dos postos de comando do Estado. Liberdade significava abolição da Monarquia Absoluta, poder de suposta origem divina, incontestĂĄvel por sua própria natureza. Igualdade significava abolição das diferenças de classe, dando-se oportunidade a todos os cidadãos de regerem o destino de suas vidas. E fraternidade era o objetivo moral e final de uma nova ordem. Para se ter uma ideia do terror que inspirava o movimento polĂ­tico subterrâneo maçônico nas classes superiores, basta dizer que o segredo que envolvia as atividades da Maçonaria era tão grande, dando origem a tão absurdas convicções, que somente em janeiro de 1983 (portanto hĂĄ apenas 4 anos) a Igreja Católica (Papa João Paulo II) deixou de considerar passĂ­veis de excomunhão os seus adeptos que se filiassem à Maçonaria. Na sua origem, a Maçonaria contava com diversos associados padres (por isso não é de estranhar a filiação maçônica de pelo menos dois padres implicados na InconfidĂȘncia Mineira); no século XVIII 27 VenerĂĄveis Mestres franceses eram padres[10], sem contar os que deviam estar em postos inferiores. A Maçonaria não é uma associação religiosa; é teĂ­sta, isto é, admite a existĂȘncia de um Ser Supremo, a que denomina Grande Arquiteto do Universo, e aceita que seus adeptos professem qualquer religião, considerando até mesmo inapto a ser maçom alguém que se declare ateu[11]. Como seu objetivo era reformar a Humanidade pela moral e pela razão, exigia, como exige, de seus filiados, apenas conduta proba, dando-lhes plena liberdade de convicções polĂ­tico-religiosas. O crescente poder polĂ­tico que assumiu no decorrer do século XIX é que criou a animosidade entre outras forças polĂ­ticas, dentre estas a Igreja Católica, só recentemente superada. Concluindo-se, vĂȘ-se que a Maçonaria no século XVIII — que é o que nos interessa para este estudo — era o elemento catalisador daquelas personalidades pensantes que não podiam representar-se por partidos polĂ­ticos e que desejavam mudanças no estado da sociedade.

A terceira pergunta bĂĄsica é: quando se introduziu a Maçonaria no Brasil? Desdobra-se essa questão em outra: a que interesse estava subordinada? Ao da Maçonaria Azul (de inspiração inglesa, tendĂȘncia monarquista constitucional) ou ao da Maçonaria Vermelha (francesa, predominantemente republicana)? É a mais difĂ­cil questão a ser respondida, devido à escassez quase absoluta de fontes. HĂĄ, todavia, indĂ­cios que permitem algumas conclusões. Embora haja na historiografia diversas afirmações de que desde 1760-1770 "navios ingleses" trouxeram essas tendĂȘncias subversivas aos portos brasileiros, as afirmativas estão desacompanhadas de qualquer prova, o que não me permite adotĂĄ-las[12]. O que hĂĄ de positivo é a existĂȘncia de uma loja na década de 1780 no Rio de Janeiro: a loja fundada por Manuel InĂĄcio da Silva Alvarenga e BasĂ­lio da Gama, disfarçada sob o nome de Sociedade LiterĂĄria. Provavelmente, a loja foi fundada no ano de 1786[13]. Depreende-se que essa academia tenha sido, na verdade, uma loja maçônica, pelos seguintes fatos: a) o Estatuto rezava em seu 1o artigo — "A boa fé e o segredo, de modo que ninguém saiba do que se tratou na sociedade"[14], b) foi fundada no perĂ­odo em que era Vice-Rei, instalado no Rio de Janeiro, o iluminista LuĂ­s de Vasconcelos e Sousa (tio do Visconde de Barbacena, Governador de Minas Gerais), membro correspondente da Academia de CiĂȘncias de Lisboa, a mesma de que era SecretĂĄrio seu sobrinho Governador e a mesma que era acusada pelo Intendente Geral de PolĂ­cia Pina Manique de ser o principal reduto da Maçonaria em Portugal; c) Manuel InĂĄcio da Silva Alvarenga era Professor de Retórica e Poética no Rio de Janeiro; nascera em Vila Rica em 1749, era mulato e graduara-se em Direito, em Coimbra, em 1776; vivia no Rio como advogado e professor, mas em 1778 recitara na Academia de Lisboa um poema — "As Artes" — considerado como trabalho poético precursor em prol da industrialização; Alvarenga teria perdido a proteção dispensada pelo colega acadĂȘmico Vice-Rei com a substituição deste pelo Conde de Resende, feroz perseguidor de iluministas (9 de janeiro de 1790); a "sociedade literĂĄria" foi fechada e acusada de jacobinismo (republicanismo e maçonaria), tendo sido aberto processo; d) do processo resultou a condenação de Silva Alvarenga a dois anos de prisão na Fortaleza da Ilha das Cobras, tendo sido indultado pela Rainha em época posterior; e) Domingos Vidal de Barbosa Laje frequentava a Sociedade LiterĂĄria de Silva Alvarenga; confessou ao Visconde de Barbacena, quando preso em 1789, que falara sobre o apoio estrangeiro ao levante com seu mestre no Rio, mas na denĂșncia escrita a que fora obrigado, deixara de relatar o fato para proteger seu mestre, Ă­dolo e amigo. Positivamente, a Maçonaria estava agindo no Brasil ainda no século XVIII. Não bastassem os indĂ­cios apontados acima, em 1799 o Conde de Resende acusava Luiz Beltrão de Gouveia de ser "jacobino e pedreiro livre". Antes disso, porém, a "caça ao jacobino" agitava Portugal (jacobino, maçom e republicano tinham a mesma conotação[15].

A Academia de CiĂȘncias de Lisboa havia sido fundada em 1778 e desde o inĂ­cio fora objeto de suspeita por parte do Intendente Geral de PolĂ­cia, Diogo de Pina Manique. Como seu Presidente era o Duque de Lafões, membro da famĂ­lia real, o reacionarĂ­ssimo Pina Manique nada pôde fazer. Mas em 1785, o Duque renunciou e passou o cargo ao Abade Correia da Silva; Manique começou então a perseguir os membros da Academia. O Visconde de Barbacena, 1o SecretĂĄrio, renunciou e abjurou dos princĂ­pios estatutĂĄrios, recebendo a proteção de Martinho de Melo e Castro (primo de sua mulher), todo-poderoso Ministro do Ultramar, que o fez nomear para Governador na distante Minas Gerais. JĂĄ o Abade Correia da Silva teve que procurar proteção no exĂ­lio. Com o estouro da Revolução Francesa, a Monarquia apavorou-se, tendo mais a esquentar-lhe a notĂ­cia de um levante em Minas Gerais. Mais poder foi dado a Diogo Pina Manique, que se dedicou com afinco à tarefa de caçar e eliminar os jacobinos. "Jacobino" na França era o partidĂĄrio de Robespierre (sinônimo de republicano e exaltado). Em Portugal, além disso, significava maçom ou pedreiro-livre. Pina Manique esforçava-se: "A ordem e a sociedade dos pedreiros-livres me mereceu sempre muita contemplação. Não obstante, a maçonaria ainda assim expandia-se, mesmo em direção à colônia". Tinha razão: com a explosão da Revolução Francesa, em pouco tempo, ainda no século XVIII, Portugal jĂĄ contava com cerca de 500 lojas maçônicas; embora o nĂșmero pareça exagerado, é certo que os franceses residentes em Lisboa "discutiam abertamente nas praças" a "próxima derrubada dos tronos". Manique agitava-se: farejava jacobino em toda parte e recomendara a um Corregedor nomeado para a Ilha da Madeira, onde, segundo informações, havia sido aberta uma loja: "Aquele que V.M. vir de sapatinho bicudo e mui brunido, atilhos nos calções, com gravata por cima da barba, colarinho até meia orelha, cabelo rente no toitiço e tufado sob a moleirinha, com suĂ­ças até aos cantos da boca, agarre-me logo dele, tranque-mo na cadeia carregado de ferros, até que haja navio para o Limoeiro: é iluminado ou pedreiro-livre!"[16].

Somente o desenrolar da Revolução Francesa, com sua acomodação após a fervura dos primeiros anos, e as notĂ­cias tranquilizadoras sobre o fracasso do levante em Minas, pôde permitir à Monarquia amortecer sua fĂșria antimaçônica. E em 1795, morreu Martinho de Melo e Castro, "poderoso instrumento do obscurantismo em Portugal"[17]. Não se deve deixar de notar, porém, que tudo isso aconteceu ainda no século XVIII e, portanto, são totalmente infundadas as dĂșvidas sobre a existĂȘncia da Maçonaria no Reino Lusitano antes do século XIX. Não acredito no nĂșmero de 500 lojas em Portugal, conforme jĂĄ dito. Acredito mesmo que, se lojas existiram, não passaram de um nĂșmero reduzido, inferior provavelmente a uma dezena. Mas isso não importa: lojas regulares, com templos próprios, horĂĄrios e regulamentos, eram, como são até hoje, em pequeno nĂșmero, devido ao evidente dispĂȘndio financeiro que acarretam. O que interessa é a existĂȘncia de indivĂ­duos maçons, que, reunindo-se em qualquer nĂșmero, lugar e horĂĄrio, constituĂ­am, informalmente, uma "loja", não importando em que parte do mundo fosse. Por isso creio ser possĂ­vel admitir a existĂȘncia de lojas maçônicas (pequenas ou grandes, regulares ou informais) no Brasil no século XVIII, seja em Salvador, Rio de Janeiro, Vila Rica ou qualquer outro lugar. Portugal vivia sob dependĂȘncia da Inglaterra desde a sua instalação como paĂ­s livre da Espanha; em Lisboa viviam numerosos cidadãos ingleses, sendo seus portos parada costumeira de navios daquele Reino. Mas a Maçonaria francesa (e também a norte-americana) tinha enorme influĂȘncia sobre a intelectualidade portuguesa de "aquém e além-mar". Diante disso, tenho como possĂ­vel afirmar que os maçons brasileiros, como os do território portuguĂȘs europeu, tanto recebiam influĂȘncia da Maçonaria Azul como da Vermelha, sendo impossĂ­vel determinar a preponderância de uma sobre a outra. Veremos esse fenômeno na InconfidĂȘncia Mineira, assim como aconteceu mais tarde no tumultuoso processo de independĂȘncia brasileira de 1820-1822.

Passemos agora ao estudo especĂ­fico da InconfidĂȘncia Mineira e sua relação com a Maçonaria, ou vice-versa. Além de considerĂĄ-lo importante para a História, não deixo de anotar que os maçons de hoje consideram como certo que o Alferes Joaquim José da Silva Xavier foi maçom. No dia 21 de abril de 1970, às 9 horas da manhã, desfilaram em Belo Horizonte cerca de mil maçons, tendo à frente seu Grão-Mestre, Deputado Federal Athos Vieira de Andrade, todos vestidos a carĂĄter, com avental azul e branco; segundo o lĂ­der, era uma homenagem a seu "irmão" Tiradentes, executado hĂĄ 178 anos. GUSTAVO BARROSO[18] comentou que Martim Francisco Ribeiro de Andrada havia escrito um livro — "Contribuindo" — no qual criara a lenda de que Tiradentes fora substituĂ­do no patĂ­bulo por outra pessoa. Todas as afirmativas são falsas porque se baseiam em que: a) legalmente a execução deveria ser em Minas Gerais e não no Rio de Janeiro (como se no processo alguém estivesse preocupado com isso...); b) o rosto de Tiradentes não foi visto por ninguém (o que é falso; a execução foi assistida por milhares de moradores do Rio de Janeiro, além de ter sido descrita por mais de um dos padres confessores que incluĂ­ram até o detalhe de que Tiradentes permanecia caminhando firme, sem vacilação, olhos pregados no crucifixo que trazia à mão, e com "rubor" nas faces); c) confessando a culpa, o Alferes parecia ter certeza de que escaparia da prisão (sem comentĂĄrios); d) o carpinteiro Isidro de Gouveia, que conhecera o Alferes, contara a parentes em São Paulo não ter podido reconhecĂȘ-lo depois de morto (pergunta-se: é fĂĄcil reconhecer alguém esquartejado, com sangue cobrindo todas as partes expostas, ainda mais depois desse antigo conhecido ter ficado trĂȘs anos preso em duras condições?) Ainda segundo GUSTAVO BARROSO, o amazonense João Leda, escrevendo em O Jornal, de Manaus, em 21 de abril de 1947, disse que MACHADO DE ASSIS afirmou em uma de suas crônicas publicadas na Gazeta de NotĂ­cias, de abril de 1892 a maio de 1897, que Tiradentes viveu até 1818, subsistindo com uma pensão autorizada por Dom João VI. Teria morrido no Rio de Janeiro, onde, desde 1810, tinha uma loja de barbeiro, dentista e sangrador, aberta a conselho do próprio PrĂ­ncipe Regente. GUSTAVO BARROSO não encontrou essa crônica de MACHADO DE ASSIS, nem eu a procurei também... Por fim, em 1982, fui surpreendido com a revelação de um amigo pessoal de que muitos maçons tinham como certo que outra pessoa fora executada em lugar de Tiradentes, que teria falecido tranquilamente em Portugal.

Essas revelações acima, a meu ver, tĂȘm apenas trĂȘs conclusões: a) a Maçonaria sente-se "responsĂĄvel" por Tiradentes; b) revelam um indisfarçĂĄvel desejo de mostrar um poder acima do comum a todos os cidadãos; c) é inacreditĂĄvel como esses boatos sobreviveram ao tempo e à evidĂȘncia das provas em contrĂĄrio. Na documentação sobre a InconfidĂȘncia Mineira encontrei indĂ­cios da participação de maçons e da influĂȘncia das ideias defendidas pela sua associação polĂ­tica secreta. Conforme observei, tais indĂ­cios podem ser sumariamente divididos em insubsistentes e indĂ­cios concretos. Encontrei, além disso, indĂ­cios mais sérios que chego a chamar de provas. A tarefa de expô-los é a que passo a executar a seguir.

5.1. IndĂ­cios insubsistentes

5.1.1. A palavra "mazombo"

Domingos de Abreu Vieira foi preso em maio de 1789 e obrigado a uma denĂșncia na prisão. Peça sucinta e escrita em evidente estado de desespero, entregou o nome de diversos companheiros de conspiração; foi, curiosamente, a que mais entregou militares. Nesse depoimento hĂĄ dois trechos interessantes para este capĂ­tulo: "(...) e que alguns oficiais estavam convidados também: o Tenente Antônio Agostinho, disse o Tiradentes que estava falado e que ele respondera que estaria pronto, pois também era mazombo (...)" — "(...) o cabeça de tudo era o Tiradentes, dizendo que ele e o Alvarenga haviam de ser os heróis da função, pois defendiam a sua PĂĄtria; que os mazombos também tinham valimento e sabiam governar (...)"[19].

Apressadamente, alguns historiadores interpretaram a palavra "mazombo" como aportuguesamento da palavra "maçom"[20]. É um erro. Em primeiro lugar, deve-se atinar para o sentido da palavra no texto, especialmente quando Abreu Vieira diz: "que os mazombos também tinham valimento". É clara a feição pejorativa do termo. A frase pode ser trocada, sem nenhum prejuĂ­zo para a explicação, por: "que, apesar de serem mazombos, também tinham valor". Estou concordando aqui com LÚCIO JOSÉ DOS SANTOS, que também depreendeu que a palavra "mazombo" era considerada um insulto; segundo ele, o DicionĂĄrio de Domingos Vieira diz — "Mazombo, termo injurioso. Filho do Brasil, oriundo de nação europeia"[21]. DELSON GONÇALVES FERREIRA, historiador e filólogo excepcional, leva a explicação mais longe: "Quem ou que eram os mazombos? — "Filhos do Brasil nascidos de gente europeia' (Moraes, o.c. 1858) — Termo um tanto desusado que, em certos pontos do nosso paĂ­s, designava o indivĂ­duo nascido no Brasil, de pais estrangeiros, especialmente de portugueses" — "Os descendentes dos primeiros colonizadores começavam a designar com a expressão africana de mazombo aos filhos dos chegados da Europa, reservando o termo portuguĂȘs crioulo para os filhos dos africanos no Brasil" (Varnhagen apud Bernardino José de Souza – DicionĂĄrio da Terra e da Gente do Brasil – Cia. Edit. Nacional – S. Paulo – 1961 - in verbete) — E Aurélio Buarque de Holanda: "IndivĂ­duo nascido no Brasil, de pais estrangeiros, especialmente portugueses" (Novo DicionĂĄrio da LĂ­ngua Portuguesa – Edit. Nova Fronteira – Rio, 19 ed., s.d. – in verbete) — Tiradentes era um mazombo. E mazombo foi também Antônio Francisco Lisboa, filho de pai portuguĂȘs, Manuel Francisco (da Costa?) Lisboa e de Isabel, uma crioula. — Diz Critilo: — sem licença do chefe não se citam — os negros, os crioulos e os mulatos, mal vestem a fardinha..." (Cartas Chilenas, IX, v. 311 a 313) — O crioulo, pois, seria o mazombo, "termo com que o reinol titulava o branco nascido no Brasil e incorporado aos interesses da sua pĂĄtria brasileira" (Manuel Rodrigues Lapa - As Cartas Chilenas - Rio - INL - 1958, pĂĄg. 52). E na pĂĄgina 69: "natural do Brasil, filho de portugueses", citando o Pequeno DicionĂĄrio Brasileiro. Registrado por Monte Carmelo no CompĂȘndio de Ortografia, pĂĄg. 412: "brasileiro de pais europeus". — Apenas se deve alargar o sentido: "mazombo não serĂĄ somente o branco nascido no Brasil, mas os mulatos e todos os filhos de portuguĂȘs aqui nascidos". Na mesma linha estão JOÃO CAMILLO DE OLIVEIRA TORRES e MARIA EFIGÊNIA LAGE DE RESENDE[22].

5.1.2. Os "sinais" de Thomas Jeferson

Em 8 de julho de 1789, Francisco Antônio de Oliveira Lopes fez mais um prolixo depoimento na prisão em Vila Rica. Nele falou sobre o que lhe relatara seu primo Domingos Vidal de Barbosa Laje sobre o encontro dele e de José Joaquim da Maia com Thomas Jefferson em Nimes, França, em 1787: "(...) E declara ele, Testemunha, que o dito seu primo lhe dissera ter assistido a uma das conferĂȘncias e dado os sinais do mesmo embaixador. E que o mesmo seu primo viera de França haverĂĄ ano e meio, com pouca diferença"[23]. Ninguém falou até hoje que as expressões usadas por Francisco Oliveira Lopes tenham alguma coisa com "sinais" maçônicos. Mas antes que alguém o faça — jĂĄ que existem muitos dizendo, vagamente, que os Autos estão cheios de provas da atuação da Maçonaria —, é preciso desmontar mais esse indĂ­cio. A Maçonaria usa, realmente, diversos sinais secretos para identificação de seus membros, tais como sinal gutural, apertos de mão, frases escolhidas etc.[24]. Não é o caso da frase de Oliveira Lopes. Interpreto o texto assim: "Domingos Vidal, meu primo, me disse ter assistido a um dos encontros entre Maia e Jefferson, tendo-me revelado as feições (ou fisionomia) do embaixador". Não pode ser de outra forma; se fosse o caso de troca de sinais maçônicos, a frase ficaria sem sentido: quem teria dado a quem os sinais? Ademais, se a frase tivesse o sentido de: "revelou-me os sinais do embaixador", seria o caso de Jefferson ter sinais maçônicos pessoais, fenômeno despropositado.

5.1.3. O "irmão" de Tiradentes

Salvador Carvalho do Amaral Gurgel, depondo em 12 de julho de 1789, referiu-se a uma conversa com Tiradentes: "(...) E falando-lhe se lhe queria vender aquele dicionĂĄrio, lhe respondeu o dito alferes que não, por o ter jĂĄ vendido a um seu irmão, mas que lho emprestava por quinze dias (...)". TARQUÍNIO J. B. DE OLIVEIRA crĂȘ que a expressão "irmão" foi um lapso de Gurgel, porque Tiradentes na verdade se referia ao Padre Francisco Ferreira da Cunha, sócio do Alferes em uma farmĂĄcia em Vila Rica, a mesma ideia criada por LIMA JÚNIOR anos antes. Na realidade, hĂĄ um erro: Tiradentes não possuĂ­a farmĂĄcia nenhuma com o Padre Francisco Ferreira. Gurgel, de fato, se referia ao Padre Francisco: em depoimento anterior (30 de junho) a frase fora: "por lhe ter dito, o mesmo Alferes, que lho não vendia por o ter jĂĄ feito àquele Padre". Diante disso só se pode concluir mesmo que Gurgel, no segundo depoimento, dissera "irmão" por um lapso. DaĂ­ não pode decorrer conclusão que autorize afirmar ter sido o Padre Francisco "irmão maçônico" de Tiradentes. Os maçons tratam-se como "irmãos" em suas reuniões e fora delas, mas isso não basta para comprovar nada neste caso, pelo simples fato de que Tiradentes possuĂ­a vĂĄrios irmãos de sangue. Mesmo que não os tivesse, o lapso de Gurgel seria compreensĂ­vel[25].

5.1.4. O "companheiro" de ClĂĄudio Manoel da Costa

Dividem-se os associados à Maçonaria em trĂȘs graus iniciĂĄticos: Aprendiz, Companheiro e Mestre. Tendo isso em vista, depara-se num trecho dos Autos com a seguinte afirmação do Padre Carlos Correia de Toledo, a respeito de uma reunião na casa de ClĂĄudio Manoel da Costa, na qual este teria dito a todos: "O Cônego LuĂ­s Vieira da Silva havia de ser, ou era um bom companheiro; porque ele, Respondente, se não lembra ao certo do termo por que se explicou..."[26]. Não creio daĂ­ poder derivar-se qualquer relação com Maçonaria. A palavra "companheiro" tem o claro significado de colega de conjura, nada mais, a meu ver.

5.1.5. A "iniciação" de Tiradentes por Álvares Maciel

Veja-se o seguinte trecho; "Possivelmente, Tiradentes foi iniciado na Maçonaria pelo Dr. José Alvares Maciel, que, de acordo com o ritual, lhe transmitiu os sinais, ensinou-lhe a palavra-passe de aprendiz. Ao apresentar-se ao comandante, Tiradentes demonstrou, provou ser maçom (renovando a prĂĄtica que tivera com Álvares Maciel) e foi finalmente atendido"[27]. Não posso deixar de concluir que esse trecho nasceu inteiramente da cabeça de seu autor, sem que estivesse apoiado em qualquer documento. O autor baseou-se na mente igualmente imaginativa de JOAQUIM NORBERTO DE SOUSA. O trecho se refere ao seguinte episódio: Tiradentes, ao procurar seu Comandante no Regimento, Ten Cel Francisco de Paula Freire de Andrada, descobriu que ele era também "iniciado" nos planos da revolta. Tudo me parece precĂĄria ou totalmente insustentĂĄvel. O encontro se deu entre Alvares Maciel e Tiradentes, que, juntos, foram à casa de Francisco de Paula (cunhado de Maciel), no final de 1788, e o detalhe do "iniciado" consta dos depoimentos de Tiradentes com outras palavras. Ora, desde o ano anterior Tiradentes obtinha de seu Comandante sucessivas licenças para ir ao Rio de Janeiro; Freire de Andrada estava hĂĄ muito "iniciado" naqueles projetos sediciosos, e sua amizade com Tiradentes datava de mais de 10 anos; não precisavam ser apresentados um ao outro, nem maçonicamente. Claro me parece que Maciel tenha tentado dizer que só naquela época seu cunhado estava tendo notĂ­cias daqueles planos e os termos significando "iniciado" tĂȘm o sentido de "introduzido", aquele a quem jĂĄ foi relatada alguma coisa sobre a qual se quer novamente falar.

5.1.6. 0 "embuçado" de Vila Rica

A notĂ­cia da prisão de Tiradentes e de Joaquim Silvério dos Reis (fato ocorrido a 10.5.1789) chegou a Vila Rica na noite de 17 de maio de 1789[28], sendo passada a ClĂĄudio Manoel da Costa, TomĂĄs Gonzaga e Diogo Pereira de Vasconcelos nessa mesma noite. Não se sabe se o próprio portador da notĂ­cia ou alguém que tenha sido por ele contatado tratou, apressadamente, de avisar os principais conjurados. É o famoso caso do "embuçado" (mascarado) que procurou ClĂĄudio Manoel, alertou-o para a necessidade da destruição dos papéis comprometedores, em seguida procurou por TomĂĄs Gonzaga e, não o achando em casa, tentou localizĂĄ-lo na casa de seu amigo Diogo Pereira de Vasconcelos. O embuçado era um homem com um largo capote que lhe chegava a cobrir totalmente, inclusive a cabeça e o rosto, fazendo-o parecer vagamente com um vulto de mulher. O mascarado estava obviamente apressado e cercava-se de cautelas, porque sabia a exata repercussão da notĂ­cia e suas consequĂȘncias. A viagem do Rio de Janeiro a Vila Rica levava 10 a 12 dias de marcha regular com paradas normais; fora trazida em menos de 7 dias, o que revela haver razão para o mascaramento do transmissor da notĂ­cia, ele mesmo o que a trouxera ou alguém que tivesse sido avisado naquele dia. Tudo me parece muito lógico e coerente: a pressa, o disfarce e a preocupação com a autodefesa. Dois autores, porém, viram nesse episódio a atuação da Maçonaria: "Esse emissĂĄrio misterioso, que foi visto por vĂĄrias pessoas, inclusive por Diogo Pereira de Vasconcellos, que narrou o fato, revela a ligação da InconfidĂȘncia com a maçonaria e, portanto, a sua amplitude. O fato de terem os inconfidentes recebido o aviso antes do Governador, é argumento decisivo"[29]. "(...) O mesmo homem misterioso falou também com ClĂĄudio Manoel da Costa, que confirmou o fato em interrogatório a que foi submetido — Quem era esse misterioso embuçado ou rebuçado, como consta dos Autos — Quem seria capaz de disfarçar-se, correndo grave risco, para ir avisar aos inconfidentes que se precatassem? — Se fosse um dos conjurados, não havia por que se embuçar para aconselhar a fuga aos companheiros (...) — Tratar-se-ia de algum estrangeiro, portuguĂȘs, possivelmente iniciado na Europa, em uma instituição secreta que teria ido avisar aos inconfidentes? – Eis urna versão. – Absurda? Não, para quem sabe o que é a pratica com prazer, como um dever, a solidariedade fraternal"[30].

Quanto aos argumentos de SALLES, acho-os extremamente vagos. O fato de terem recebido os inconfidentes o aviso antes do Governador não é argumento decisivo em nada, menos ainda para concluir-se que só a Maçonaria poderia ter feito isso. Estranhamente, em todo o ótimo livro de SALLES, é a Ășnica referĂȘncia feita à Maçonaria, que, sendo admitida por ele, vem desacompanhada de quaisquer outras ligações. Quanto aos argumentos de ALBUQUERQUE, considero-os inconvincentes. AliĂĄs ele próprio confessa que o que escreveu não é História, mas uma versão. Concordo quando diz que sua versão não é absurda; aliĂĄs, com todo o respeito, aceito o direito de qualquer um escrever o que quiser. Mas daĂ­ não posso acompanhar a conclusão de que só um maçom prestaria aquele serviço a seus irmãos de conjura, nem a de que só um maçom seria capaz de disfarçar-se e correr riscos, nem a de que um inconfidente não-maçom dispensaria a camuflagem. Fazendo um pequeno reparo à imprecisão dos termos "estrangeiro, portuguĂȘs" (todos os brasileiros eram portugueses), só posso admitir como hipótese sua conclusão de que teria sido o embuçado um indivĂ­duo iniciado em uma instituição secreta na Europa, que, desacompanhada de provas, torna-se um indĂ­cio histórico insubsistente.

5.1.7. O triângulo da bandeira da InconfidĂȘncia

É fato bem conhecido do pĂșblico em geral que o triângulo constante da bandeira do atual Estado de Minas Gerais foi adotado como homenagem à bandeira idealizada pelos inconfidentes de 1785-1789, e como homenagem maior ao martĂ­rio de todos eles em prol da independĂȘncia de nossa PĂĄtria. Discutirei aspectos especĂ­ficos sobre a bandeira criada nas reuniões inconfidentes no capĂ­tulo referente à história do movimento; aqui me cabe fazer apenas ligeiras considerações sobre o liame existente na historiografia entre a Maçonaria e o projeto da bandeira. Devo concluir que a participação da Maçonaria na InconfidĂȘncia, vista pelo ângulo desse projeto, ainda é um indĂ­cio insubsistente, embora seja tão popular. Eu diria que é uma dessas coisas em que todos acreditam mas que ninguém viu. O motivo é simples: não hĂĄ provas, só opiniões. Eis o que diz ALBUQUERQUE, resumindo um pensamento generalizado não escrito: "(...) bastaria contemplar-lhe a Bandeira. É indiscutivelmente de inspiração maçônica. O triângulo nela existente não permite perdurar a menor incredulidade. Longe de nós, a estultice de asseverar a procedĂȘncia maçônica em tudo que figure um triângulo" (...) "É admissĂ­vel supor-se que o Triângulo da Bandeira dos Inconfidentes seja inexpressivo, que nada signifique, quando os promotores do movimento eram maçons e todos nós maçons bem sabemos o que exprime o Triângulo?" (...) "Por que apenas no depoimento de Tiradentes hĂĄ uma inquirição, ao de leve acerca do Triângulo da Bandeira, com uma resposta evasiva de que ele representava a SantĂ­ssima Trindade? — Na Maçonaria, o Triângulo simboliza uma Trindade Sagrada: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. E ele fica bem à vista de todos os que estão no Ocidente"[31].

Faço os seguintes reparos às afirmações de ALBUQUERQUE: a) a bandeira idealizada pelos inconfidentes (como explicarei melhor no capĂ­tulo próprio) não foi um triângulo, mas trĂȘs triângulos concĂȘntricos, com uma inscrição; b) pode ter sido de inspiração maçônica, mas não de "indiscutĂ­vel inspiração maçônica", o que permite, sim, perdurar a incredulidade; c) nem todos os "promotores do movimento eram maçons", hĂĄ indĂ­cios de que vĂĄrios foram maçons — aliĂĄs, prova só hĂĄ de que dois deles foram maçons, entre centenas de participantes; d) não apenas no depoimento de Tiradentes hĂĄ inquirição acerca da bandeira; diversos interrogados se manifestaram a respeito, inclusive, mais detalhadamente, o Padre Carlos Correia de Toledo; e) não hĂĄ nada que prove ter sido o triângulo inconfidente baseado no sĂ­mbolo maçônico e não no sĂ­mbolo católico; diante da inexistĂȘncia de prova, pode-se admitir tanto um caso como o outro, como outra inspiração qualquer — pitagórica, racionalĂ­stica, estética, etc.; o triângulo fica "bem à vista de todos os que estão no Ocidente" (um dos lados de um templo maçônico), como também fica bem à vista de todos os que frequentam a Igreja Católica, encimado por uma pomba, representando a SantĂ­ssima Trindade a que se referiu Tiradentes. O triângulo da bandeira dos inconfidentes, portanto, a meu ver, é apenas um indĂ­cio leve e insubsistente da presença da Maçonaria no movimento, não obstante a palavra de TARQUINIO JOSE BARBOZA DE OLIVEIRA que chegou a escrever que o trĂ­plice triângulo "presume" a trilogia Liberdade, Igualdade e Fraternidade, como acontecera nos Estados Unidos e na França"[32]. CECILIA MEIRELES deixou a questão indefinida, nas letras e sentimentos de um poema: "Que bandeira se desdobra? — Com que figura ou legenda? — Coisas da Maçonaria — do Paganismo ou da Igreja? — A SantĂ­ssima Trindade? — Um gĂȘnio a quebrar algemas?"[33].

5.1.8. O carĂĄter maçônico da reunião de 26.12.1788

TARQUÍNIO J. B. DE OLIVEIRA foi um historiador excepcional; farmacĂȘutico e industrial que deixou sua terra — São José do Rio Pardo, SP — para viver em Ouro Preto; nós, mineiros e brasileiros, perdemos, lamentavelmente, a força de sua criação em 1980, quando faleceu, no auge de seu trabalho de incansĂĄvel caçador da verdade sobre a InconfidĂȘncia Mineira. Posso dizer que a história da InconfidĂȘncia só veio a pĂșblico com amplitude à altura de sua importância após seu trabalho gigantesco de garimpar as inĂșmeras fontes esparsas pelos arquivos brasileiros e portugueses; reuniu e publicou suas pesquisas em notas à nova edição dos Autos da Devassa, que são, na verdade, um livro à parte dentro dos Autos e sem as quais o processo é quase incompreensĂ­vel. No meio desse trabalho faleceu em 26.12.1980, com 63 anos, exatamente 192 anos depois da data da reunião final inconfidente[34]. Além das notas aos Autos, TARQUÍNIO OLIVEIRA deixou publicados diversos trabalhos sobre a história de Minas, jĂĄ citados em outro capĂ­tulo, que são indispensĂĄveis a qualquer pesquisador do assunto. Emocionado, encontrei na Casa dos Contos, em Ouro Preto, pequenas explicações suas, emolduradas e pregadas nas paredes, como auxilio aos visitantes desse museu nacional; até nisso pensava e queria contribuir o discreto cientista da História.

Feita essa introdução, posso chegar ao ponto que interessa aqui: TARQUÍNIO OLIVEIRA, sinto, tinha uma ânsia incontĂ­vel de escrever o mĂĄximo possĂ­vel sobre a InconfidĂȘncia Mineira. Talvez sentindo que o tempo e a doença lhe consumiam as forças e verdadeiramente desesperado de que suas descobertas não pudessem ser totalmente deixadas para os futuros pesquisadores, ousou ir além dos documentos que encontrara. Entre todas as centenas de tĂ­tulos que examinei para a redação deste livro, afirmo com sinceridade que foi um dos pouquĂ­ssimos casos que encontrei de ousadia por honestidade. Quem estĂĄ acostumado à pesquisa histórica intensa sobre um determinado tema compreende isso: hĂĄ coisas sobre as quais não se encontram provas, mas o faro e o instinto do pesquisador lhe dão a Ă­ntima certeza da veracidade. Cria-se um dilema: publicĂĄ-las ou não. Muitos não se dão a esse sofrimento, escrevendo e publicando qualquer coisa que sua mente imaginativa descobre; não era o caso de TARQUINIO OLIVEIRA. Um escritor chegou a dizer, com ironia, que TARQUINIO possuĂ­a uma mente fértil. Creio que a explicação é diferente: TARQUÍNIO não quis deixar passar impublicadas algumas conclusões sobre as quais não tinha provas porque sentia-as necessĂĄrias para os futuros pesquisadores, como este modesto admirador que o via trabalhar absorto no Arquivo PĂșblico Mineiro. Esse é o caso da explicação que ele dĂĄ para a reunião decisiva entre os inconfidentes mineiros, realizada na casa do Ten Cel Francisco de Paula Freire de Andrada, na noite do dia 26 de dezembro de 1788, e que teria tomado o carĂĄter de reunião maçônica: "(...) Como o Vig. Carlos Correia de Toledo esteve dois ou trĂȘs dias em Mariana, hospedado lĂĄ com Faustino Soares de AraĂșjo, voltando a Vila Rica na manhã de 26-12, entendĂ­amos que a reunião definitiva da InconfidĂȘncia teria ocorrido nesta Ășltima data. Cremos necessĂĄrio corrigi-la para 27-12, dia de São João Evangelista, consagrado desde Cagliostro, pela maçonaria, à eleição de seus dignitĂĄrios nas lojas. HĂĄ evidĂȘncia sobeja da existĂȘncia, ao tempo da InconfidĂȘncia, de templo maçônico oculto na casa de Antônio Vieira da Cruz, no Alto da Cruz, primo do Pe. José da Silva e Oliveira Rolim. Pelo menos LuĂ­s Beltrão de Gouveia, TomĂĄs Antônio Gonzaga, Tiradentes e João Rodrigues de Macedo eram confirmadamente maçons, ocorrendo o mesmo com o Pe. José da Silva e Oliveira Rolim (...)." Nessa reunião, Tiradentes teria sido apontado "orador" (cargo em loja maçônica) e transformaram-se os trabalhos em carĂĄter de "Conselho" ou "Grande Loja", pois iniciaram-se ao pôr-do-sol (18 horas) e estariam terminados às 21 horas[35]. Tenho a observar o seguinte: a) a data de 26 de dezembro para a reunião é mais certa, devido a outros detalhes dos Autos, que não vem ao caso deslindar; a mudança que TARQUÍNIO estabelece apenas nesse trecho visa adaptar sua explicação com os outros indĂ­cios que aponta; b) infelizmente, não hĂĄ "evidĂȘncia sobeja da existĂȘncia, ao tempo da InconfidĂȘncia, de templo maçônico oculto na casa de Antônio Vieira da Cruz (...)"; hĂĄ informações de que o Padre Rolim se hospedara em dezembro de 1788 na casa de Vieira da Cruz, além de outras casas (Rolim estava escondido e frequentemente trocava de hospedeiro naqueles dias) — ele mesmo, Rolim, e seu escravo, o confirmaram[36]; em época indefinida, realmente, Antônio Vieira Cruz construiu um templo em terreno de sua propriedade (que ficou conhecido em Ouro Preto como "Alto do Cruz" ou, por corruptela, "Alto da Cruz"); eu mesmo vi os restos desse templo, desenterrados acidentalmente hĂĄ cerca de 15-20 anos e que foram motivo de reportagem em jornais mineiros; o problema é que a data da filiação de Oliveira Rolim e de Antônio Cruz à Maçonaria, bem como a da construção do templo, não constam de nenhum documento e por isso não podem ser fixadas ao tempo da InconfidĂȘncia — 1785-1789. A quem não puder ir a Ouro Preto ver os restos desse templo maçônico, indico duas reportagens onde hĂĄ fotografias: Revista Veja de 30 de maio de 1979, pĂĄgs. 111-112; e jornal DiĂĄrio da Tarde, de Belo Horizonte, 11 de setembro de 1978; c) Luiz Beltrão, TomĂĄs Gonzaga, Tiradentes e João Rodrigues de Macedo não eram "confirmadamente maçons"; sobre Beltrão pairou uma acusação nesse sentido em 1799 (dez anos após a InconfidĂȘncia), feita pelo Vice-Rei; sobre Gonzaga hĂĄ indĂ­cios intelectuais de simpatia pelas mesmas ideias; sobre Tiradentes e João Rodrigues de Macedo hĂĄ fortes indĂ­cios, que considero mais concretos e serão analisados à frente; mas a realidade é que não existem provas confirmativas; d) a transmutação da reunião dos principais lĂ­deres inconfidentes em "Conselho" ou "Grande Loja", tendo Tiradentes assumido o lugar de "Orador" é fruto exclusivo da criação de TARQUÍNIO OLIVEIRA; baseou-se ele na data, que em diversos trechos dos Autos fixa em 26-12 e só neste muda-a para 27-12[37], no fato de que Tiradentes foi um dos lĂ­deres que mais falaram na reunião — se não o que mais falou, além de ter mudado até a orientação que aos planos queria imprimir seu próprio Comandante, Francisco de Paula Freire de Andrada — e no fato, improvĂĄvel, de que a reunião tenha começado pontualmente às 18 horas (que seria um horĂĄrio simbólico para a Maçonaria); a Ășnica coisa concreta a respeito é que a reunião foi à noite (Alvarenga se recusara a ir e estava jogando gamão com João Rodrigues de Macedo, quando, mais ou menos, entre 19 e 20 horas, foi chamado por bilhete enviado pelo Padre Toledo — "Alvarenga, Estamos todos juntos. Venha Vossa MercĂȘ jĂĄ. Amigo Toledo").

Nada indica que a reunião de 26.12.1788 tenha tido carĂĄter maçônico. Baseio minha convicção nos seguintes fatos: 1) a reunião foi a Ășltima de uma série que se desenvolveu nos 10 dias anteriores, dispersa por diversos locais; teve todo o aspecto de reunião final e decisiva, pelo nĂșmero de participantes, pelo que foi discutido e pelo fato de, em seguida, seus participantes terem-se dispersado, cada um com sua missão definida; 2) a ela compareceram quase todos os principais lĂ­deres, de todas as Comarcas de Minas, de todas as classes sociais (excluĂ­dos os negros e mulatos) e das mais diversas qualificações (fazendeiros, militares, engenheiros, advogados, padres, etc.); se tivesse sido uma reunião maçônica, terĂ­amos que admitir que todos eram maçons, jĂĄ que a uma reunião maçônica só comparece quem é filiado — a exceção só se dĂĄ nas solenidades festivas, quando a reunião é aberta ao pĂșblico "não iniciado", e não são revelados então os elementos esotéricos, tais como a linguagem e o comportamento próprio dos maçons; 3) dentre os diversos depoimentos que descreveram o acontecido nessa reunião de 26 de dezembro, nenhum deixou escapar a menor referĂȘncia, nem por deslize, a qualquer comportamento maçônico na oportunidade; ao contrĂĄrio, depreende-se da leitura dos Autos que muitos falaram, algumas vezes ao mesmo tempo, discutiram-se numerosos detalhes do plano revolucionĂĄrio, havia muita gente em pé (um "doutor pequenino" dava "pulos de alegria" e dizia que estava em condições de instalar a casa de fundição de moedas — era José de SĂĄ e Bittencourt); havia gente que mal sabia ler e escrever (Francisco Antônio de Oliveira Lopes), portanto destituĂ­da da mĂ­nima capacidade para ser maçom; uns entravam enquanto outros saĂ­am. Lamento ter que concluir que a caracterização da reunião de 26.12 como maçônica fica incluĂ­da neste estudo como mais um indĂ­cio insubsistente da presença da Maçonaria na InconfidĂȘncia, contrariando a tese do mestre TARQUÍNIO J. B. DE OLIVEIRA.

5.1.9. As informações de Joaquim FelĂ­cio dos Santos

JOAQUIM FELÍCIO DOS SANTOS assume um lugar importante na historiografia da InconfidĂȘncia Mineira pelo fato de ter sido o primeiro a apontar indĂ­cios da atuação da Maçonaria no movimento. Escreveu seu famoso livro "Memórias do Distrito Diamantino da Comarca do Serro Frio; ProvĂ­ncia de Minas Gerais" de 1862 a 1864 (em semanĂĄrio de Diamantina e a seguir em forma de livro, em 1868), e tornou-se a fonte em que se baseou JOAQUIM NORBERTO DE SOUSA, ainda no século XIX, para apontar também os mesmos indĂ­cios. Da mesma fonte partiram as outras afirmativas existentes sobre o assunto. O livro de FELÍCIO DOS SANTOS não trata especificamente da InconfidĂȘncia Mineira nem da Maçonaria. São memórias generalizadas sobre a história de sua terra, que incluem tanto observações pessoais, como outras passadas de terceiros; o autor foi contemporâneo da maioria dos fatos que descreveu (nasceu em 1828 e faleceu em 1895), assim como foi contemporâneo de outros que presenciaram fatos anteriores à sua existĂȘncia pessoal. O tom que o livro transmite é de absoluta seriedade, além da competĂȘncia, o que o fez uma obra bĂĄsica na pesquisa da história de Minas. JOAQUIM FELÍCIO DOS SANTOS foi autor de um anteprojeto do Código Civil, não aproveitado devido à sua extensão, mas que foi elogiado por CLÓVIS BEVILÁQUA, autor do projeto vencedor, verdadeiro monumento da cultura universal; perder para ele não era demérito para ninguém. Como o Padre Rolim faleceu em 1835, ao tempo da redação de seu livro jĂĄ se tinham passado 27 anos, e, note-se, a Maçonaria estava no auge de sua influĂȘncia polĂ­tica"[38].

Além de JOAQUIM NORBERTO DE SOUSA, também admitiram como verdade as informações relativas à Maçonaria partidas de FELÍCIO DOS SANTOS, os historiadores TARQUÍNIO J. B. DE OLIVEIRA, GUSTAVO BARROSO, G. HÉRCULES PINTO, AUGUSTO DE LIMA JUNIOR, A. TENORIO CAVALCANTE DE ALBUQUERQUE, TITO LÍVIO FERREIRA e MANOEL RODRIGUES FERREIRA[39]. As informações de FELÍCIO DOS SANTOS são as seguintes: "Foi na IntendĂȘncia do Dr. Beltrão que se fez a prisão do nosso distinto patrĂ­cio, o Padre José da Silva e Oliveira Rolim. Não hĂĄ mineiro que ignore a história de nossa gloriosa tentativa de independĂȘncia de 1789; por isso, e por não pertencer ao quadro desta narração, dispensamo-nos de narrĂĄ-la. — Talvez que em parte nenhuma da Capitania, fosse ela aceita com mais entusiasmo que na Comarca do Serro Frio: é que sobre nós mais pesava o jugo da metrópole. Os conciliĂĄbulos faziam-se alta noite em casa de José da Silva e Oliveira, pai do Padre Rolim; a eles concorriam as principais pessoas do Tijuco, e diz-se que até o Intendente Beltrão se envolvera na conjuração; mas guardava-se o maior segredo sobre suas deliberações e nomes dos comprometidos. Os conjurados eram todos iniciados na maçonaria, introduzida por Tiradentes, quando por aqui passou vindo da Bahia para Vila Rica. Contavam com o apoio de toda a população e só se esperava o rompi- mento em Vila Rica, quando se soube que o traidor Joaquim Silvério dos Reis denunciara tudo (...) Dos conjurados do Tijuco só foi condenado o Padre Rolim (...) O nosso patrĂ­cio Dr. José Vieira Couto, médico-naturalista, tendo finalizado seus estudos em Coimbra no ano de 1777 e viajado grande parte da Europa, em companhia de José BonifĂĄcio de Andrada e de Manuel Ferreira da Câmara, tinha voltado a Tijuco. O Dr. Couto, apesar de monarquista por dedicação à Rainha Dona Maria I, era um dos mais fortes propugnadores das novas ideias. Um de seus irmãos, José Joaquim Vieira Couto, foi perseguido como iniciado na Maçonaria e condenado pelo tribunal da Inquisição. O Dr. PlĂĄcido, o Padre José da Silva e Oliveira Rolim, que jĂĄ vimos ter sido condenado como inconfidente, e outras muitas pessoas distintas faziam parte de uma associação, com o fim de promover a independĂȘncia do Brasil e libertar dos tiranos a pĂĄtria: assim denominavam os monarcas (...) Não sabemos como a Maçonaria se introduzira no Brasil; é certo, porém, que no meado do século passado (n.a. XVIII) jĂĄ funcionava na Bahia o Grande Oriente maçônico, e é um fato, que se não pode negar, a sua importante cooperação no trabalho lento, oculto, persistente, para a nossa independĂȘncia. A InconfidĂȘncia de Minas tinha sido dirigida pela Maçonaria. Tiradentes e quase todos os conjurados eram pedreiros-livres. — Quando Tiradentes foi removido da Bahia, trazia instruções secretas da Maçonaria para os patriotas de Minas. Em Tijuco o primeiro que se iniciou foi o Padre Rolim, depois o Cadete Joaquim José Vieira Couto e seus irmãos. — A conspiração malogrou-se. Da famĂ­lia Couto, o Cadete Joaquim José Vieira Couto foi o Ășnico perseguido; faleceu em Tijuco em consequĂȘncia de uma enfermidade adquirida na cadeia de Vila Rica. Ainda existem algumas pessoas que assistiram a seu funeral: seu cadĂĄver ia fardado, com um ramalhete de rosas brancas na mão direita e revestido das insĂ­gnias maçônicas do grau de Mestre (...)"[40].

As observações que tenho a fazer sobre esses trechos — que, repito, foram admitidos como verdade e ponto de partida para outras deduções em diversas obras —, são as seguintes: a) realmente, foi na IntendĂȘncia de Luiz Beltrão de Gouveia que se fez a prisão do Padre José Rolim, e hĂĄ indĂ­cios fortes nos Autos de que Beltrão teria sido inconfidente; a perseguição a Rolim, como contrabandista, só foi iniciada por ele após o inĂ­cio da repressão à InconfidĂȘncia; daĂ­, entretanto, não decorre indubitavelmente que o Intendente participava dos "conciliĂĄbulos" que se faziam "alta noite" na casa dos Rolim, como quer fazer depreender FELICIO DOS SANTOS; a suposição é coerente, mas não se baseia em prova, b) tenho que discordar da afirmação de que "os conjurados eram todos iniciados na maçonaria"; pode-se considerar até mesmo como prova a filiação de Luiz Beltrão, mas só a partir de 1799, quando foi disso acusado pelo Vice-Rei; o Padre Rolim seria enterrado com paramentos maçônicos, mas em 1835 — prova anterior de sua filiação não foi descoberta até hoje; como demonstrarei à frente, prova de terem sido maçons só encontrei com relação a apenas dois inconfidentes; c) as afirmações — "(...) maçonaria, introduzida por Tiradentes, quando por aqui passou vindo da Bahia para Vila Rica (...)" e "A InconfidĂȘncia de Minas tinha sido dirigida pela Maçonaria. — Tiradentes e quase todos os conjurados eram pedreiros-livres. — Quando Tiradentes foi removido da Bahia, trazia instruções secretas da Maçonaria para os patriotas de Minas (...)", merecem especial atenção porque são a base de todas as conclusões sobre Maçonaria existentes na historiografia da InconfidĂȘncia Mineira; não se sabe — até hoje não se encontrou documento comprobatório — onde JOAQUIM FELÍCIO DOS SANTOS obteve a fonte de suas afirmações; Tiradentes, efetivamente, em sua adolescĂȘncia e na casa dos 20 anos de idade, foi tropeiro (mercador ambulante), além de dentista prĂĄtico, viajando por extensas partes do território mineiro, chegando comprovadamente a estar na Comarca do Serro Frio; não hĂĄ, porém, nenhuma prova de que tenha estado em Salvador, nenhuma prova de que tenha recebido missão militar naquela cidade (daĂ­ a palavra "removido" de FELICIO DOS SANTOS), menos ainda prova de que tenha se filiado à Maçonaria lĂĄ; assim não hĂĄ também prova de que tenha sido o introdutor da Maçonaria em Diamantina, trazendo "instruções secretas"; d) o funeral de Joaquim José Vieira Couto no rito maçônico, a admitir-se como verdadeiro, foi, seguramente, posterior ao encerramento do processo da InconfidĂȘncia, em data não fixada por FELICIO DOS SANTOS e, desse modo, do fato não pode decorrer prova da presença da Maçonaria no movimento de 1785-1789; e) não é "certo" que em meados do século XVIII "jĂĄ funcionava na Bahia o Grande Oriente maçônico"; simplesmente não foram ainda encontradas provas disso; f) finalmente, a afirmação — "A InconfidĂȘncia de Minas tinha sido dirigida pela Maçonaria" — é, com toda sua importância, apenas uma versão de FELÍCIO DOS SANTOS, que, para a História, tem o valor relativo atribuĂ­do a todas as afirmações desacompanhadas de fontes comprobatórias; Incluo, pois, as afirmações do importante livro de JOAQUIM FELICIO DOS SANTOS, neste subcapĂ­tulo dos indĂ­cios insubsistentes, porque estão sem o acompanhamento das fontes de onde se teriam originado.

5.2. IndĂ­cios concretos

Neste segundo subcapĂ­tulo ainda continuo a tratar de indĂ­cios. A diferença que me obriga a chamĂĄ-los de concretos é que são pistas encontradas nos Autos da Devassa e em documentação esparsa. DesnecessĂĄrio dizer que indĂ­cios não são provas, apenas introdução a elas; de todo modo, esclareço que ainda aqui os indĂ­cios são discutĂ­veis, estando à disposição de refutação.

5.2.1. Os passos dos comerciantes cariocas e suas ligações com João Rodrigues de Macedo e Joaquim Silva Xavier

A cidade do Rio de Janeiro, pela sua privilegiada localização, tornara-se no século XVIII, especialmente na segunda metade, o porto principal do Brasil. Recife e Salvador, sĂ­mbolos da era do açĂșcar no predomĂ­nio da receita comercial do Estado, foram perdendo, gradativamente, a sua primazia, consequĂȘncia natural das transformações econômicas. O ouro de Minas Gerais e do interior mais fundo (GoiĂĄs e Mato Grosso) saĂ­a, inicialmente, pelo Porto de Parati, mas, desde as primeiras décadas do século XVIII, começou a canalizar-se pelo porto da BaĂ­a de Guanabara. Também a latitude mais agradĂĄvel da bela cidade de São Sebastião tomou-a mais atrativa para o fluxo imigratório reinol; o fato é que, no século XVIII, o Rio era a sede do Vice-Reinado em que se transformara o Estado do Brasil dentro da Monarquia Portuguesa. No final do século, possuĂ­a o Rio numerosas casas de comércio, como entreposto principal da permutação entre o Estado Brasileiro e a Metrópole monopolizadora. Ali estavam comerciantes de manufaturas tĂȘxteis e de couro, utensĂ­lios domésticos e de trabalho rural, sal, tabaco, pólvora, gado, madeira, armas e uma infinidade de produtos que entravam necessariamente do exterior, devido à ausĂȘncia absoluta de fĂĄbricas instaladas nesta parte do Reino Lusitano. No Nordeste, incluindo a Bahia, predominavam os comerciantes de açĂșcar e algodão, mas no Rio de Janeiro havia-se desenvolvido uma extensa gama de representantes dessa classe, devido à preponderância econômica que ia tomando a região centro-sul do Estado Brasileiro. Havia mesmo no Rio um bairro cuja concentração de comerciantes holandeses era tão flagrante que recebeu o apelido de Flamengo. Os comerciantes, como sabemos, dividem-se em dois tipos bĂĄsicos: varejistas e atacadistas — ou, como se dizia, de retalho e a grosso. Logicamente são eles pequenos e grandes, tendo interesses menores e maiores. Os interesses geram preocupações e estas o pensamento, tomado o termo no seu sentido de "interesse de classe". Ninguém desconhece que os comerciantes, assim como os industriais, os operĂĄrios, os intelectuais e outros constituem, como classes, o que chamamos hoje de "grupos de pressão" dentro da sociedade. Embora em condições diferentes das de hoje, esse fenômeno sempre existiu.

No século XVIII estava o Reino PortuguĂȘs, como ainda a maior parte do mundo civilizado, sob o regime polĂ­tico denominado de MonĂĄrquico Absolutista, ou como se diz em história polĂ­tica, o "Ancien RĂšgime". O substrato ideológico de sustentação do poder era a teoria do direito divino do soberano. Indiscutido hĂĄ séculos (desde o fim do Império Romano), dentro do regime não havia lugar para partidos polĂ­ticos, pela óbvia razão de que não havia como estar contra o Rei, que era o próprio Estado em pessoa. Ou se era vassalo ou estrangeiro. Tudo foi muito bem até o efervescente século XVIII, quando, para desgosto dos monarcas e da classe dominante dos Estados — a nobreza —, o mundo começou a encher-se de pensadores subversivos, que, em decorrĂȘncia da evolução natural do pensamento humano, pontificaram aqui e ali, martelando insidiosamente a estrutura ideológica que sustentava o poder. Como jĂĄ tratei desse problema em outro capĂ­tulo — o iluminismo — dispenso-me de relembrar os nomes desses expoentes. Os comerciantes, que nos interessam especificamente neste passo, eram uma classe afastada do poder e do comando da direção do Estado; tinham assumido, porém, uma posição econômica contraditória ao seu diminuto poder polĂ­tico. Surgiu, assim, no século XVIII, em todo o mundo, o fenômeno muito conhecido da luta da burguesia contra a nobreza; era o embate, estrutural, de uma nova classe que viera se desenvolvendo hĂĄ mais de um século, contra outra que exercia o comando dos Estados pelo simples fato de possuir sangue de presumida origem divina. Deixando de lado a explicação macroeconômica que apenas foi esboçada, surge uma questão — o que pretendiam os comerciantes brasileiros no final do século XVIII e que se chocava com o estado polĂ­tico da sociedade? A resposta é: liberdade comercial; o direito de comprar e vender de quem quer que fosse, o direito de expandir-se econômica e politicamente, o direito de reger seu próprio destino. O Estado Brasileiro e seus comerciantes sofriam o peso do monopólio metropolitano do comércio internacional — comerciantes brasileiros (portugueses do Brasil, corrija-se) só podiam comerciar com reinóis e vice-versa. Lisboa centralizava a distribuição internacional da produção de todas as partes do Reino.

Como podiam obter os brasileiros esse direito? Pedindo à Monarquia que mudasse a sua polĂ­tica em favor de seus interesses ou lutando por isso. A situação no século XVIII não parecia muito adequada à possibilidade de que o pedido fosse atendido. Portugal era uma potĂȘncia econômica: o ouro, o açĂșcar, o tabaco, o algodão e os diversos minerais brasileiros forneceram-lhe nos séculos XVI, XVII e XVIII material suficiente para equilibrar sua balança comercial com as outras potĂȘncias europeias e manter-se em situação de preponderância, se não em relação à Inglaterra, à França e à Espanha, pelo menos em relação a todos os outros reinos europeus. É no Rio de Janeiro que conseguimos notar os primeiros "passos" dos comerciantes — tĂ­picos representantes da burguesia — para mudar a situação. Isso seria notado mais tarde na Bahia — 1798 —, em Pernambuco — 1801 e, especialmente, 1817 — e finalmente no processo final e vitorioso de independĂȘncia de 1820-1822. Quem eram os comerciantes interessados na independĂȘncia do Brasil? Logicamente os que tinham maiores interesses, os atacadistas, aqueles que viviam da importação e exportação. Em sua esteira estavam os comerciantes menores e uma série de outros representantes de classe, cujos interesses ideológicos coincidiam com os daqueles (padres, profissionais liberais, advogados, técnicos, fazendeiros, etc.). Como poderiam agir os comerciantes? Naturalmente não seria através de petições à Rainha. Agiram do modo determinado inexoravelmente pela situação polĂ­tica: na clandestinidade. E o partido polĂ­tico clandestino que norteava ideologicamente esses interesses de classe era a Maçonaria. Par- tidos (ou fenômenos semelhantes) que defendiam os interesses do Absolutismo havia vĂĄrios: as Ordens de nobreza (Cavaleiros disso e daquilo), a Igreja Católica ligada estreitamente ao poder temporal, ideólogos de tendĂȘncia conservadora, Academias oficiais etc. Mas, na clandestinidade do século XVIII só havia um elemento aglutinador de interesses discordantes do status social: a Maçonaria, com seus objetivos de extinguir o Absolutismo e impor o Constitucionalismo (fosse ele monĂĄrquico ou republicano), extinguir a nobreza ou pelo menos tirar-lhe o monopólio dos condutos da direção do Estado, extinguir as distinções sociais que eram determinadas pelo nascimento e obter uma nova ordem mundial, baseada num sonhado perĂ­odo de fraternidade geral e pacĂ­fica.

Os primeiros passos dados pelos comerciantes cariocas no sentido de conseguir a independĂȘncia do Brasil — com a consequente liberação internacional dos portos, seu interesse especĂ­fico — não se podem fixar cronologicamente com exatidão. Faço-o provisoriamente no ano de 1786, à falta de outros documentos em contrĂĄrio, pois um ano seria o prazo suficiente para que tivesse havido as reuniões preliminares à remessa que fizeram, em 1787, de uma pessoa, à França, com a missão de contatar o Embaixador dos Estados Unidos, Thomas Jefferson, em busca de um possĂ­vel apoio daquele novo paĂ­s livre da América a uma tentativa de independĂȘncia do Brasil. TARQUINIO J. B. DE OLIVEIRA supôs que teriam sido necessĂĄrios pelo menos quatro anos de contatos e reuniões entre intelectuais e comerciantes iluministas do Rio de Janeiro para decidirem-se por aquela iniciativa. Mas em 2 de outubro de 1786 José Joaquim da Maia manteve a primeira correspondĂȘncia preliminar com Thomas Jefferson, dando como referĂȘncia para o desejado encontro informações do Professor José Maria Joaquim Vigarous[41].

José Joaquim da Maia e Barbalho era carioca e estudava Medicina em Montpellier. Seu professor nessa escola, o Dr. Vigarous, era membro preeminente da Maçonaria francesa. Maia era filho de um empreiteiro de construção civil do Rio. Todos esses detalhes jĂĄ foram ditos nos nĂșmeros precedentes. O importante aqui é constatar que Maia foi mandado ao contato com Thomas Jefferson por comerciantes cariocas e não de motu proprio, como pareceu a LÚCIO JOSÉ DOS SANTOS; isso consta do depoimento de Francisco Antônio de Oliveira Lopes, feito em 8 de julho de 1789: "(...) que andando nos estudos em Montpellier, conhecera dois sujeitos que se diziam enviados. Um deles, filho do Rio de Janeiro ao pé da Lapa. E que estes foram mandados por certos comissĂĄrios daquela cidade a tratar com o embaixador da América Inglesa um levante na dita cidade do Rio (...)"[42]. Lopes obtivera essas informações de seu primo, Domingos Vidal, que também esteve presente a um dos encontros entre Maia e Jefferson. O terceiro "sujeito" era José Mariano Leal da Câmara. A correspondĂȘncia entre o estudante brasileiro e Thomas Jefferson serĂĄ analisada melhor no capĂ­tulo referente à história do movimento. Ali se verĂĄ a exata proporção da missão que foi confiada a Maia; Jefferson fez um extenso relatório ao seu superior nos Estados Unidos e pode-se notar que recebeu precisas e corretas informações do emissĂĄrio dos iluministas brasileiros.

Os negociantes do Rio de Janeiro aparecem em diversos outros trechos dos Autos: "(...) Que a tropa paga estava jĂĄ falada e pronta pelo dito Alf. Tiradentes, o qual tinha vindo do Rio de Janeiro mandado por certos comissĂĄrios, a ver se cĂĄ se queriam unir (...)" (Francisco A. Lopes, 15.6.1789). Começam a aparecer seus nomes e suas ligações com Joaquim José da Silva Xavier e João Rodrigues de Macedo: o encontro de Tiradentes e José Álvares Maciel no Rio (quando este regressava de Lisboa) em julho/agosto de 1788 fora na casa de Francisco José Freire. Francisco de AraĂșjo Pereira era o maior comerciante do Rio, considerado pelo Vice-Rei um "crĂ­tico franco dos métodos da administração colonial". José Aires Gomes disse, pouco depois de um encontro com o Alferes, que os "homens de negócio do Rio apoiavam o levante porque desejavam "liberdade de Negócio" e porque "Negociantes, que só olham para os seus interesses, e marcham para onde se lhe figuram mais vantajosos". Eles queriam o apoio de Minas "para fazerem juntos uma América Inglesa'"[43]. Antônio Ribeiro de Avelar, Antônio Gonçalves Ledo e Antônio Jacinto Machado são os trĂȘs comerciantes cariocas que mais aparecem nos Autos. A conduta de um descendente de Antônio Gonçalves Ledo (Joaquim Gonçalves Ledo) no processo de independĂȘncia brasileira de 1820-1822 é fartamente conhecida, como prócer da Maçonaria de tendĂȘncia republicana, afinal perseguido e exilado por Pedro I, a quem inclusive fizera Grão-Mestre de sua Ordem (Irmão Guatimozim). Sobre Antônio Machado falarei adiante; mas é sobre Antônio Ribeiro de Avelar que recaem as mais claras indicações de ter sido um dos comerciantes cariocas que participaram do processo revolucionĂĄrio frustrado de 1785-1789.

Antônio Ribeiro de Avelar era comerciante atacadista estabelecido no Rio na Rua dos Pescadores (Visconde de InhaĂșma) e correspondente de João Rodrigues de Macedo (o maior banqueiro de Minas) naquela cidade[44]. Exaustivamente pressionado, Tiradentes, no seu 11o interrogatório, foi obrigado a revelar os nomes das pessoas com quem convivia no Rio de Janeiro; apontou então os nomes de Antônio Ribeiro de Avelar e Possidônio Carneiro. Foi um recurso tĂĄtico: Possidônio Carneiro era leproso (Tiradentes o tratara e bem sabia que os devassantes não quereriam trazĂȘ-lo para perto de si para interrogĂĄ-lo) e Avelar (que Tiradentes apenas indicara como seu cliente de tratamento odontológico) não podia ser deixado sem menção. Tiradentes hospedava-se em sua casa e certamente fora visto por dezenas de pessoas lĂĄ, entrando e saindo; se não o mencionasse, a atitude fatalmente seria descoberta e vista como proteção digna de suspeita. Avelar foi chamado a explicar-se em 30 de julho de 1791. Como não sabia do teor do depoimento de Tiradentes, revelou que o Alferes ia à sua casa com frequĂȘncia hĂĄ muitos anos e que, em 1789, fora "poucas vezes". Na verdade, conheciam-se hĂĄ 14 anos: desde 1777, quando o Alferes esteve no Rio destacado entre as forças militares de reforço à guarnição carioca contra possĂ­vel ataque espanhol[45]. Discreto em seu depoimento, Avelar não foi mais incomodado e nesse mesmo ano e no seguinte desdobrar-se-ia cautelosamente na ajuda aos inconfidentes presos, tarefa de que se desincumbiu por interesse próprio e pela solicitação que fazia outro amigo do Alferes, o banqueiro de Vila Rica João Rodrigues de Macedo. No dia 28 de abril de 1792, arrematou o escravo do Padre Rolim — Alexandre da Silva —, levado a leilão quando seu dono partia para Lisboa. João Rodrigues de Macedo mandava-lhe dinheiro para esse e outros favores: sequestrando-se os bens do contador de Macedo, Vicente Vieira da Mota, achou-se uma barra de ouro no valor de 44$207 réis — "Cuja barra e guia se achavam embrulhadas em um papel com uma cota por fora, que diz o seguinte — Esta barra é para remeter a Antônio Ribeiro de Avelar para uma assistĂȘncia que mandei que fizesse o Ledo; e no mesmo papel, por dentro dele, se acha outra cota do teor seguinte — Que ordenei ao Tenente Antônio Ribeiro de Avelar que assistisse o Ledo para as recomendações de Antônio Xavier da Silva — quarenta e cinco mil, cento e cinquenta; (...)". E ainda outro bilhete escrito por Avelar em que pedia a Vicente Vieira da Mota trĂȘs oitavas de ouro, com a sua resposta de as ter recebido em 18.3.1791. O "Antônio Xavier da Silva" do bilhete sugere fortemente um trocadilho com o nome do jĂĄ preso Alferes Silva Xavier[46].

Tiradentes, realmente, tinha amigos especiais no Rio de Janeiro. Em conversa com Alvarenga Peixoto em Cachoeira do Campo, talvez em março de 1789 (detalhe constante do segundo depoimento de Alvarenga), é alertado pelo poeta e fazendeiro para a vigilância do Vice-Rei; Tiradentes respondera que "ele e o seu partido sabiam bem os passos do Ilmo. Exmo. Vice-Rei". Esses amigos e colegas de "partido" parecem ter sugerido ao Alferes Silva Xavier a ideia de ir a Lisboa ver com os próprios olhos em que nĂ­vel estavam os passos da Maçonaria na Europa, a mesma preocupação que fizera o "partido" delegar missão a José Joaquim da Maia junto a Jefferson. Tiradentes fez dois requerimentos para viajar a Lisboa, com a desculpa de tratar de negócios de famĂ­lia (ele não tinha ninguém em Portugal): o primeiro em março de 1787 e o segundo, reiterado com a alegação de que não pudera ir por doença, em fevereiro de 1788. Ambos foram deferidos, mas o Alferes não chegou a ir. A chegada de José Álvares Maciel (comprovadamente maçom, como veremos), supriu-lhe as informações de que necessitava sobre o apoio estrangeiro ao levante, fazendo-o passar, a partir de julho de 1788, "de imediato à ação revolucionĂĄria"[47].

Passada a fase de repressão à InconfidĂȘncia, ainda se podem detectar os passos da Maçonaria, se bem que, no caso, como auxĂ­lio aos companheiros desgraçados. Antônio Ribeiro de Avelar, antes da partida do navio que levaria Vicente Vieira da Mota para Moçambique, escreveu a João Rodrigues de Macedo, dizendo que ainda tentaria "dar alguns passos" para tentar atrasar a saĂ­da de Vicente; interessante desta carta é o espĂ­rito avarento tĂ­pico do comerciante que ressalta da alma apenas envernizada pelo Iluminismo: Avelar nota que partiriam TomĂĄs Gonzaga, José Aires Gomes e outros, mas que faria o possĂ­vel para que, não sendo possĂ­vel embarcar todos (como lhe dissera o comandante do navio), ficasse pelo menos Vicente Vieira, que fora aquele com quem mais gastara... Lembra a Macedo que metade dos bens de Vicente ficara com ele, e então poderia ser reembolsado... "Como amigo, lhe peço também se não esqueça a respeito do que me ficou devendo José João. Os anos vão passando, vamos caminhando para a morte, e o que não arrumarmos em vida depois não se ajusta..." Assinou a carta como "Antônio Ribeiro de Avelar & Cia". A carta anexa de Vicente Vieira da Mota enumera a Macedo os nomes daqueles que o ajudaram na prisão no Rio: além de Avelar, seu sobrinho e mais Antônio José da Costa Barbosa, BrĂĄs Carneiro Leão, João Francisco da Silva e Sousa e Geraldo Belens[48].

Outro comerciante carioca que aparece nos Autos ajudando os inconfidentes presos é Antônio Jacintho Machado (estabelecido como Avelar, na Rua dos Pescadores), que escrevera a Manuel Pereira Alvim (de Vila Rica), pedindo, se possĂ­vel, reembolso da quantia de 50$000 réis anuais, que estava mandando e continuaria a remeter a Domingos de Abreu Vieira em Angola. Tanto Antônio Machado como Manuel Pereira Alvim eram negociantes relacionados hĂĄ anos com João-Rodrigues de Macedo. Interessante dessa carta é que o espĂ­rito avaro do comerciante estĂĄ ausente em Machado, ao contrĂĄrio de Avelar: ele pede o reembolso se possĂ­vel, mas se não o fosse, diz que "sempre serei satisfeito e ele nunca serĂĄ falho da mencionada despesa enquanto eu puder e ele viver"; diz que o faz apenas por compadecer-se do "miserĂĄvel estado" do velho Abreu Vieira e porque era um "amador da Humanidade". A expressão tem forte indĂ­cio de significar "maçom", isto é o praticante da "religião da humanidade"[49].

Quanto a João Rodrigues de Macedo, suas ligações com a InconfidĂȘncia são muito evidentes nos Autos. O banqueiro, proprietĂĄrio do palĂĄcio residencial que era a Casa dos Contos, tinha, além dos acima apontados a ligĂĄ-lo àqueles comerciantes amigos e do "partido" de Tiradentes no Rio, diversas referĂȘncias nos Autos sobre reuniões entre inconfidentes realizadas em sua casa. Sobre ele paira uma suspeita muito forte de ter sido maçom. Direi mesmo no subcapĂ­tulo à frente, que pairam provas. TARQUINIO OLIVEIRA notou que, de sua correspondĂȘncia, ressaltam "não só o comportamento, mas sobretudo suas convicções iluministas"[50]. Em sua casa reuniram-se todos os principais inconfidentes, devendo-se notar as referĂȘncias, interessantes para este capĂ­tulo, às figuras de Tiradentes, Padre José Rolim, Luiz Beltrão de Gouveia, José Vieira Couto, Nicolas George Gwerck, Padre LuĂ­s Vieira da Silva. Sobre todos pesam suspeitas de filiação à Maçonaria, sendo que hĂĄ provas posteriores com relação a Rolim, Beltrão, Vieira Couto e, contemporâneas à InconfidĂȘncia, com relação a LuĂ­s Vieira da Silva. Nicolas Gwerck (o "secretĂĄrio" do "jacobino" Luiz Beltrão) confessou que em Vila Rica, hospedado na casa de Macedo, encontrara-se com LuĂ­s Vieira da Silva para conversar[51]. Sobre Macedo deixo para falar à frente, no subcapĂ­tulo das provas. Resta aqui concluir com mais um indĂ­cio da agitação subterrânea dos comerciantes liberais ainda no século XVIII. Em 1797, foi à Europa — de acordo com o autor da notĂ­cia, "enviado pelas associações secretas" —, para solicitar apoio da França ao movimento que se formava na Bahia (e estouraria no ano seguinte), o comerciante Domingos José Martins, o mesmo lĂ­der destacado da Revolução Pernambucana de 1817[52].

5.3. Provas

Encontrei duas provas concretas da presença da Maçonaria na InconfidĂȘncia Mineira. Para ser mais exato: encontrei provas de que houve dois indivĂ­duos maçons no movimento. O instinto me diz que houve mais de uma dezena de maçons entre os inconfidentes de 1785-1789, mas as provas que posso apresentar se limitam a duas pessoas: José Álvares Maciel e Padre LuĂ­s Vieira da Silva. É natural que, do cotejo dessas provas, se depreende a existĂȘncia de diversos outros maçons, mas, infelizmente, não em carĂĄter documental.

A primeira prova é a confissão de José Álvares Maciel feita ao padre que o assistiu na prisão no Rio de Janeiro, Frei Raimundo Penaforte[53]. Maciel, que era um jovem cientista de 28 anos em 1788, introduzira-se na Maçonaria em Portugal, provavelmente sob inspiração de seu mestre em Coimbra, Domingos Vandelli, a quem se atribui a introdução dessa associação em Portugal[54]. Sobre sua vida e este detalhe hĂĄ mais dados no nĂșmero 4.2.4. Como notou NICIA VILELA LUZ, Maciel fora um "representante dessa nova geração que na Europa recebia uma educação menos clĂĄssica, mais voltada para as ciĂȘncias experimentais e que no Velho Mundo presenciara o impacto polĂ­tico produzido pela independĂȘncia dos Estados Unidos (...)". Segundo ela, "pragmĂĄtico por formação e tendĂȘncias (...), Maciel certamente se inclinava mais para as ideias inglesas ou as instituições americanas do que para o racionalismo francĂȘs. Passara um ano e meio na Inglaterra (...). Filiara-se, na Europa, à maçonaria e é possĂ­vel que sua ação tivesse maior amplitude do que a que os documentos da devassa deixam entrever"[55]. PragmĂĄtico, técnico, iluminista e maçom, Maciel dedicou-se com afinco a trabalhar pela independĂȘncia do Brasil; foi ele o transmissor das notĂ­cias obtidas de Thomas Jefferson por José Joaquim da Maia em Montpellier, quando chegou ao Rio de Janeiro, em julho de 1788. Imediatamente contatado por Tiradentes, através dele e, posteriormente, de Domingos Vidal de Barbosa Laje, souberam os maçons e outros conspiradores do Rio e de Minas os exatos termos da resposta de Jefferson e o real apoio estrangeiro com que se podia contar para um levante. José Alvares Maciel era, sem embargo, um jovem de 29 anos quando foi preso e encarcerado. Toda a sua formação no Brasil fora feita em um ambiente profundamente católico e sua filiação à Maçonaria se dera no efervescer de uma onda de entusiasmo que o colheu nos bancos universitĂĄrios e que o seguiu pela França e Inglaterra onde fez estudos de aperfeiçoamento em engenharia. Preso durante trĂȘs anos em penosas condições, sofrendo a iminĂȘncia de uma morte cruel, abateu-se-lhe o espĂ­rito de tal forma que, ao ser chegada a etapa final do processo, sofria de uma forte crise de consciĂȘncia que o fez confessar a Frei Raimundo Penaforte que era maçom. O padre confessor deixou escrito que Maciel se transformara, reconvertendo-se a uma situação de cristão exemplar; suas atitudes, ao ouvir a sentença que o condenava, como a outros, à morte na forca, foram de um misticismo nitidamente causado pelo terror psĂ­quico. Permanecia com a expressão serena, exortava um companheiro a rezar para a Divina ProvidĂȘncia. Frei Penaforte, traindo o segredo de sacramento, deixou escrito que Maciel se sentia de novo cristão, deixando de ser o que se tornara "ao passar pela fornalha da franco-maçonaria".

Desse modo fica concretizada a prova de que José Álvares Maciel foi maçom. Toda a sua carreira é coerente com esse posicionamento: sua ligação com Vandelli, sua viagem à Inglaterra (onde se encontrou com negociantes em Oxford, com os quais discutiu assuntos relacionados com a independĂȘncia do Brasil, conforme confessou no seu 1o depoimento — 26.11.1789), seu encontro com Tiradentes no Rio, seus passos e posições assumidas nas reuniões inconfidentes em Vila Rica e, por fim, sua própria confissão. Não hĂĄ na historiografia qualquer refutação a essa prova; pelo contrĂĄrio[56].

A segunda e Ășltima prova tive ocasião de descobrir no depoimento de Vicente Vieira da Mota, prestado no Convento da Ordem Terceira de São Francisco, no Rio, no dia 20 de julho de 1791, jĂĄ na condição de réu[57]. É preciso relembrar antes que: a) Vicente Vieira era gerente e contador do banqueiro João Rodrigues de Macedo, "governando toda sua casa", e estava, portanto, bem a par de todas as reuniões promovidas na Casa dos Contos, residĂȘncia e escritório de Macedo; b) o contador fora interrogado antes, em 1789, de duas formas — a primeira, extra-autos, em carĂĄter reservado, pelo Governador, acerca dos negócios de Macedo e pessoas de seu relacionamento; a segunda, como testemunha, a quem foram dirigidas perguntas incisivas de que custosamente conseguiu esquivar-se com recursos frĂĄgeis; por isso sua liberdade ficara "pendente" e sobre sua cabeça sempre pairou a ameaça da prisão e da forca; c) aquele depoimento de julho de 1791 jĂĄ o fazia na condição de réu, mandado apanhar pelos devassantes cariocas; portanto estava longe da proteção do Governador de Minas e mais perto da forca; em suma, Vicente estava apavorado, sentia-se perdido e contava com dois anos de preocupações pesando-lhe na mente. Insistentemente pressionado para indicar as pessoas que conversaram sobre projetos sediciosos na casa de João Rodrigues de Macedo, Vicente, cada vez apertado, nomeava apenas o Padre LuĂ­s Vieira da Silva. Os interrogadores, então, apertam-no especificamente sobre isso: por que nomeava apenas LuĂ­s Vieira da Silva? A sua resposta saiu confusa e quase foi perdida pelo escrivão que, custosamente, anotou-a: "Respondeu que a razão que tinha para preferir no castigo o dito Cônego, era por ser o atual, e mestre da aula daquelas, para ele Respondente tão aborrecidas prĂĄticas.

Como interpretar essa estranha resposta? A palavra "atual" estĂĄ completamente sem sentido no texto. Do mesmo modo "mestre da aula". São forçosamente equilibradas na explicação seguinte — "daquelas (...) tão aborrecidas prĂĄticas". Veja-se que ele separa, confusamente, "atual" e "mestre". Não consigo entender essa resposta a não ser que coloque os termos na seguinte ordem: "A razão que tinha, para incluir o cônego em preferĂȘncia na lista das pessoas que mereciam castigo, era por ser ele o atual mestre da aula daquelas tão aborrecidas prĂĄticas". Ainda assim a resposta continua estranha. Como entender a expressão "atuar", e "mestre da aula"? Partindo da hipótese, admissĂ­vel, que a palavra "aula" significava "conferĂȘncias" ou "reuniões", ainda resta sem sentido a palavra "atual", que, sem sombra de dĂșvida, só pode significar "o deste tempo", ou "o deste perĂ­odo". Portanto, a hipótese só pode ser concluĂ­da com o sentido a seguir: "mestre (ou professor) das conferĂȘncias deste perĂ­odo".

Agora vejamos uma explicação menos forçada para a estranha resposta: Vicente Vieira da Mota, desnorteado e pressionado, deixou escapar a informação de que o Cônego LuĂ­s Vieira da Silva era o "atual mestre daquelas prĂĄticas"; ou seja: ele era o VenerĂĄvel Mestre nas reuniões maçônicas que se faziam na casa de João Rodrigues de Macedo naquele perĂ­odo. O cargo de VenerĂĄvel Mestre (dirigente mĂĄximo de uma loja) é eletivo entre os componentes de uma loja, dentre os que detĂȘm o grau de Mestre e é exercido por um perĂ­odo fixo, que pode ser renovado[58]. Mota assistia às reuniões, do lado de fora ou de dentro, e sabia perfeitamente a posição dos frequentadores, pois morava dentro daquele palĂĄcio. Mesmo que não fosse ele próprio maçom — no que não acredito — tinha condições bastantes para conhecer, pelas conversas preliminares e posteriores a qualquer reunião fechada, diversos detalhes do que se passava. Só um ingĂȘnuo seria capaz de desconhecer o que acontecia dentro de sua própria residĂȘncia. E pela resposta analisada, Vicente Vieira não estava ignorante do que acontecia ali. Acrescente-se que Vicente Vieira referia-se, indubitavelmente, às prĂĄticas sediciosas, porque para livrar-se, aduz na resposta que para ele eram elas "aborrecidas". Se eram aborrecidas, conhecia-lhes o conteĂșdo...

Acho a explicação de JOSE GERALDO VIDIGAL DE CARVA- LHO[59] para a frase, superficial e inconvincente: "Para Vicente Vieira da Mota, o Côn. LuĂ­s Vieira era "o atual e Mestre da aula daquelas tão aborrecidas prĂĄticas", o que pelo contexto significa que não apenas lia a história da "América Inglesa", mas preconizava como atuar no Brasil os mesmos processos revolucionĂĄrios." Creio que a palavra "atual" continua sem justificativa.

Outro subsĂ­dio para a compreensão desse trecho é saber que "Mestre da aula" é uma expressão quase igual a "Mestre em CĂĄtedra", tĂ­tulo dado na Maçonaria inglesa de então ao VenerĂĄvel Mestre de uma loja[60].

Ajuntemos agora mais fatos e a figura do dono da casa — João Rodrigues de Macedo. No dia 15 de dezembro de 1780, o gerente de Macedo, Vicente Vieira, escreveu uma carta-resposta a outra enviada pelo Ouvidor da Comarca do Rio das Mortes, o futuro inconfidente (e ex-estudante em Coimbra, contemporâneo de Gonzaga, Barbacena, Vandelli, José BonifĂĄcio de Andrada, etc.) InĂĄcio José de Alvarenga Peixoto: "Recebi de Vm. a tempo, que o Sr. João Roiz jĂĄ estava recolhido à casa; o seu preto veio aqui e como não trazia cartas, senão para o PalĂĄcio, para encaminhar, o seu preto (...) se encaminhou e de lĂĄ é que me vieram as que Vm. me escreve. Mandei buscar o caixote, que fica nesta casa para entregar ao Pedreiro Mestre LuĂ­s Vieira (...)"[61]. Entre os documentos arrolados por HERCULANO GOMES MATHIAS na Coleção da Casa dos Contos, da pĂĄgina 73 a 78, hĂĄ vĂĄrios recibos e documentos passados por "mestres pedreiros" por obras na Capitania. Não hĂĄ nenhum LuĂ­s Vieira entre eles, nem são chamados de "pedreiros mestres". O pai de Aleijadinho, por exemplo, intitulava-se "Mestre de Obras". Nos Autos também consta o mesmo: os pedreiros eram chamados de "mestre pedreiro" e não "pedreiro mestre". Repare-se, por fim, que a carta de Vicente Mota escreve "Pedreiro Mestre LuĂ­s Vieira", tudo em iniciais maiĂșsculas[62]. Havia um outro Padre LuĂ­s Vieira à época, mas bem mais novo e residente em Minas Novas; era sobrinho de Domingos de Abreu Vieira e recém-ordenado em 1789[63].

Mais um subsĂ­dio: hĂĄ referĂȘncias de que as lojas, no século XVIII, possuĂ­am um Ritual e um Catecismo[64], duas coisas diversas; no sequestro dos livros de LuĂ­s Vieira da Silva encontrou-se um estranho "Catecismo de Montpellier", em 5 volumes (o Padre Toledo tinha outro, em dois volumes, e o Padre Manoel Rodrigues da Costa mais um, em quatro volumes); e no inĂ­cio do século XIX detectou-se uma "Academia dos Verdadeiros Maçons" em Montpellier[65], sendo que desde 1778 um certo "Montpellier" criara um rito maçônico intitulado "Rito da Academia dos Verdadeiros Maçons", uma das principais fontes da maçonaria secreta[66]. Não pude achar nenhuma referĂȘncia a esse "Montpellier", mas suponho ter sido um tĂ­tulo nobiliĂĄrquico, tal como barão, visconde ou semelhante, ligado, é claro, àquela cidade. Sobre o "estranho" Catecismo de Montpellier, descobri duas informações esclarecedoras, após a primeira edição deste livro. Elas não anulam uma possĂ­vel ligação dessa obra com a Maçonaria, mas colocam-na num plano mais claro. A primeira informação me foi fornecida pelo historiador Monsenhor Geraldo Mendes Monteiro (que a retirou do livro "BĂ­blia e catequese", do Padre J.E.M. Terra, S.J., Ed. Loyola, 1981, pĂĄg. 134): a) o Catecismo de Montpellier é uma obra de Dom Carlos Colbert de Groissy, bispo de Montpellier, publicada em Paris em 1702; b) a obra estĂĄ eivada de "jansenismo", isto é, doutrina herética exposta por Cornélio Jansen — teólogo holandĂȘs, n. 1585, f. 1638 — em "Augustinus", obra póstuma, na qual se defende uma limitação da liberdade humana, baseada em que a graça é dada ou recusada a certas pessoas desde o seu nascimento, por interpretação das teses de Santo Agostinho sobre a graça, o livre arbĂ­trio e a predestinação; c) o Catecismo de Montpellier tornou-se, na sua época, "estandarte de uma oposição" e entrou para o Index Librorum Proibitorum em 1721. A segunda informação tirei-a do livro de Delson Gonçalves Ferreira, "Cartas Chilenas; retrato de uma época", pĂĄg. 168: em 30 de setembro de 1770, o Rei de Portugal, sob influĂȘncia do MarquĂȘs de Pombal, baixou um alvarĂĄ proibindo que se usasse qualquer outra obra no ensino da lĂ­ngua, que não fosse a "GramĂĄtica Portuguesa" de Antônio José dos Reis Lobato; o alvarĂĄ faz menção expressa e especial à proibição do "Cathecismo de Montpellier".

João Rodrigues de Macedo, portanto, concluo, abrigava em sua casa, num dos vĂĄrios salões belĂ­ssimos que continha (e que podem ser vistos, restaurados, hoje em dia), uma loja maçônica, reunindo algumas das cabeças pensantes de Vila Rica e provavelmente de diversos outros municĂ­pios. E sou forçado a ousar e concluir junto com TARQUÍNIO J. B. DE OLIVEIRA que "se havia uma loja secreta na capital de Minas, o grão-mestre mais indicado pela farta disponibilidade de meios e de pessoal espalhado por toda a Capitania seria exatamente Macedo (...)"[67].

No terreno das provas, paro por aqui; mas no campo de uma honesta suposição, creio que, dentre os elementos aptos a serem qualificados como maçons existentes em redor do nĂșcleo do poder da Capitania poderiam ser citados, além do Grão-Mestre João Rodrigues de Macedo e do VenerĂĄvel Mestre do perĂ­odo de 1788 em diante LuĂ­s Vieira da Silva, seus contemporâneos Luiz Beltrão de Gouveia, TomĂĄs Antônio Gonzaga, ClĂĄudio Manoel da Costa, Diogo Pereira de Vasconcelos, José Pereira Ribeiro, José Álvares Maciel, Francisco de Paula Freire de Andrada, InĂĄcio José de Alvarenga Peixoto e o agitado Alferes Joaquim José da Silva Xavier, a quem LuĂ­s Vieira admirava, chamando-o perante BasĂ­lio de Brito, de "rapaz herói", que ao Brasil serviria muito se houvesse outros como ele.

5.4. Conclusões

Sobre Maçonaria e sua relação com a InconfidĂȘncia Mineira de 1785-1789, adoto as seguintes conclusões: a) o movimento inconfidente não foi dirigido pela Maçonaria nem todos os confidentes eram maçons; havia condições polĂ­ticas e econômicas na raiz do processo, suficientes para sua deflagração, coincidentes com os objetivos dos maçons e da Maçonaria, mas não dependentes da existĂȘncia destes; b) a Maçonaria esteve presente nas articulações do movimento no Rio de Janeiro e em Vila Rica, por lojas organizadas, mas ainda em perĂ­odo embrionĂĄrio; em decorrĂȘncia disso, a InconfidĂȘncia não foi movimento exclusivamente maçônico nem preponderantemente maçônico (aqui discordo, lamentavelmente, das teses de meus mestres MANOEL RODRIGUES FERREIRA e TITO LIVIO FERREIRA)[68]; c) a atuação da Maçonaria foi importante, mas, paradoxalmente, secundĂĄria, porque seu papel foi apenas o de aglutinar elementos e ideias predispostos por condições estruturais ao movimento de independĂȘncia; d) as divergĂȘncias verificadas entre os inconfidentes (causa de seu enfraquecimento e consequente frustração) tiveram origem polĂ­tica, consubstanciadas em posicionamento polĂ­tico, que, coincidindo ou não com as ideias também divergentes na Maçonaria, não podem ser vistas apenas sob o ângulo maçônico, do modo como é magistralmente elaborado e sustentado no livro citado dos historiadores FERREIRA.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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[1] KLOPPENBURG, 131; PALOU, 51 e segs; FIGUEIREDO, 39.

[2] FERREIRA & FERREIRA, 110, 119, vol. I.

[3] Este livro foi publicado em 1989. Esse comentĂĄrio, portanto, deve ser contextualizado para a época (nota de Raul Sturari).

[4] FERREIRA & FERREIRA, 209, vol. I; 436, vol. II.

[5] FERREIRA & FERREIRA, 64, vol. I; FIGUEIREDO, 230, 335.

[6] ALBUQUERQUE, 38; PALOU, 255.

[7] ALBUQUERQUE, 21-22.

[8] A-I-179; A-II-91; A-VIII-19.

[9] Essa referĂȘncia, assim como as demais com caracteres semelhantes, significa Autos de Devassa (A), volume (em nĂșmeros romanos) e pĂĄgina (em nĂșmeros arĂĄbicos).

[10] ALBUQUERQUE, 39; PALOU, 138.

[11] KLOPPENBURG, 131.

[12] LIMA JÚNIOR, "NotĂ­cias...", 233; "História...", 13.

[13] FERREIRA & FERREIRA, 100, 168, vol. I.

[14] SALLES, "Silva Alvarenga...", 12-14.

[15] A-I-364; A-III-454; A-VIII-l8-19, 187, 337; SALLES, 1973, "Silva Alvarenga...", 12-14; FERREIRA & FERREIRA, 1972, 100, vol. I).

[16] A-Vlll-18-19; TORRES, LuĂ­s Wanderley, "Tiradentes...", 150-151; NOVAIS, 163.

[17] A-lll-455.

[18] BARROSO, "A fĂĄbula...".

[19] A-I- 123-124.

[20] ALBUQUERQUE, 35; PINTO, G. Hércules, 80.

[21] SANTOS, LĂșcio, 98-99.

[22] FERREIRA, Delson, "O Aleijadinho", 27-28; TORRES, João Camilo, "História..."; 695; RESENDE, 19.

[23] A-II-9l.

[24] KLOPPENBURG, 115-116; FIGUEIREDO, 321, 477-478, 507.

[25] A-I-209; A-II-2l8; A-III-346; LIMA JUNIOR, "História...", 68; PINTO, G. Hércules, 33; JOSÉ, "Tiradentes", 40; FIGUEIREDO, 200.

[26] A-VIII-143; PALOU, 97-98; FIGUEIREDO, 109, 252.

[27] ALBUQUERQUE, 93.

[28] A-l-l81; A-II-228, 232, 240.

[29] SALLES, "Vila Rica...", 184.

[30] ALBUQUERQUE, 142-143.

[31] ALBUQUERQUE, 117, 120.

[32] A-III-505-506.

[33] MEIRELLES, "Romanceiro...", 74.

[34] OLIVEIRA, TarquĂ­nio, "Procurando...".

[35] A-III-505-506.

[36] A-II-372 e A-III-453.

[37] A-VIII-267.

[38] SANTOS, Joaquim FelĂ­cio; Revista do Arquivo PĂșblico Mineiro, 1984.

[39] A-VIII-375; OLIVEIRA, TarquĂ­nio, "As falsas ...", 4-5; BARROSO, "História secreta ...", 151-175; PINTO, G. Hércules, 33; ALBUQUERQUE, 93, 102; LIMA JÚNIOR, "O Alferes ...", 18; "História ...", 71; FERREIRA & FERREIRA, 123, vol. I.

[40] SANTOS, 1976, p. 165-166, 169, 187-188.

[41] A-I-179 e A-VIII-17.

[42] A-II-63, 90-91; SANTOS, LĂșcio, 108-109, 112, 317.

[43] A-I-l77; A-II-48; A-III-502; MAXWELL, 101-153-154.

[44] A-II-368; A-VI-364.

[45] A-V-73, 79-80; BELO, 215.

[46] A-ll-368; A-Vl-364.

[47] A-V-123;A-VIII-l07.

[48] AZEVEDO, "Documentos ...", 224; OLIVEIRA, TarquĂ­nio, "CorrespondĂȘncia", 67-68, 72.

[49] A-IX-l57, 188; AZEVEDO, "Documentos...", 272-273; OLIVEIRA, TarquĂ­nio, "CorrespondĂȘncia", 58-59; FIGUEIREDO, 37.

[50] A-IX-342.

[51] A-II-246, 373.

[52] RUY, 159.

[53] A-V-328; A-IX-178.

[54] A-II-270-271.

[55] LUZ, 403.

[56] A-V-332; MENESES, 153.

[57] A-V-418.

[58] FIGUEIREDO, 187, 209, 523; PALOU, 24-25.

[59] CARVALHO, José Geraldo, "Ideologia...", 29-38.

[60] FIGUEIREDO, 255.

[61] OLIVEIRA, TarquĂ­nio, "CorrespondĂȘncia...", 96, vol. II.

[62] A-IX-147, 235; MATHIAS, "A Coleção...", 73-78.

[63] A-IX-154.

[64] PALOU, 165.

[65] A-VI-318, 349; PALOU, 181.

[66] FIGUEIREDO, 395.

[67] OLIVEIRA, TarquĂ­nio, "CorrespondĂȘncia...", 58.

[68] FERREIRA & FERREIRA, espec. 130, vol. I.



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